O poder da audiência e o fim dos rótulos.

O discurso inflamado de Kevin Spacey, no Edinburgh Television Festival, deixou clara a revolução que atravessa a indústria do entretenimento e da comunicação.

Quando David Fincher decidiu produzir House Of Cards, nenhum dos grandes estúdios e produtoras de conteúdo apostaram na ideia. Tudo porque eles não tinham um piloto da série e não existiam evidências concretas de que uma fórmula tão inovadora de entretenimento, com personagens excêntricos e discussões em alto nível sobre a dinâmica do poder fosse dar certo na lógica do broadcasting.

Aconteceu que o piloto da série não foi produzido justamente pela complexidade da trama. Os 45 minutos padrões não seriam suficientes para apresentar as diversas camadas da história e a multiplicidade de seus personagens. Os grandes produtores até se encantavam pelo roteiro, mas nenhum deles apostou na série ou arriscou seus planos comerciais. Uma triste rotina que há muito tempo assombra a indústria e reduz a possibilidade de produções inovadoras ganharem espaço.

House of Cards by David Fincher

O único produtor que apostou todas as suas fichas nessa história foi o Netflix. O serviço de streaming, que começava a se destacar pelo conteúdo proprietário, resolveu dar uma chance para ao elenco comandado pelo experiente protagonista Kevin Spacey.

Hoje, indicada ao Emmy em diversas categorias e assumindo a posição de conteúdo mais assistido do Netflix, serviço responsável por 1/3 de todo o tráfego de dados dos EUA, o sucesso de House of Cards coloca em jogo a antiga lógica da indústria. Não apenas pela maneira e por quem o conteúdo foi produzido, mas principalmente pelo ponto de vista do negócio.

O sucesso da trama mostrou ao mundo que a audiência clama pelo controle e que essa é uma informação que não pode mais ser ignorada. As pessoas querem assistir aos seus programas como, quando e onde quiserem por um preço justo. Este parecer ser o único caminho para combater o fantasma da pirataria.

“we have learned the lesson that the music industry didn’t learn — give people what they want, when they want it, in the form they want it in, at a reasonable price, and they’ll more likely pay for it rather than steal it”.

O antigo modelo onde os grandes produtores escolhiam suas apostas para a grade de programação, vem sendo contestado pelos que prezam pela liberdade criativa e também em relação ao consumo de conteúdo.

Parece uma premissa clara que daqui pra frente mais e mais séries com menor orçamento e tramas inovadoras terão espaço para ir ao ar em plataformas como o Netflix ou qualquer outro serviço de streaming.

O consumo de conteúdo sem restrições de device ou tela, parece declarar o fim dos rótulos como os conhecemos. Termos como: Série de TV, Websérie, Programa de TV, entre outros, cada vez mais devem fazer menos sentido para as pessoas em um mundo multiplataforma.

Em seu discurso Kevin enfatizou a importância de pensar o entretenimento não mais pautado por rótulos:

“If you watch a TV show on your iPad is it no longer a TV show? The device and length are irrelevant … For kids growing up now there’s no difference watching Avatar on an iPad or watching YouTube on a TV and watching Game Of Thrones on their computer. It’s all content. It’s all story.”

Questões como essa parecem se tornar cada vez mais frequentes colocando à prova modelos de negócio, constituídos com base nestes rótulos e formatos da indústria, não apenas no entretenimento mas também, como por exemplo, do próprio Branded Content. Afinal, o que difere, hoje, um conteúdo de uma marca feito para internet de um bom comercial hospedado no Youtube?

Cada vez mais as linhas se embaçam e quem se liberta são as histórias. O nosso negócio sempre foi pautado por elas e na minha modesta opinião, já estava na hora de nos lembrarmos disso.

Agradecimentos ao Raphael Pavan pela referência.

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