Essa história é bem boa, mesmo para quem não é assim tão fã de Elvis.
É um post sobre aqueles momentos mágicos da vida em que a gente comunga com a nossa essência, com o nossa vocação, nosso propósito. E tudo em volta vai sumindo e vai ficando só você e você mesmo, sabe? Aquele momento que geralmente você precisa ir buscar, quando precisa se lembrar quem você é DE VERDADE.
Foi assim.
Como você sabe, existiram dois Elvis. O Elvis magrinho da pélvis inquieta e do rock and roll e o Elvis gorducho, de costeletas e golas altas, roupas purpurinadas e das canções românticas.
Mas o que muita gente não sabe é que entre essas duas fases, houve um momento mágico, mais precisamente em dezembro de 1973, em que o Elvis conseguiu ser apenas ele mesmo.
Os 15 anos anteriores foram totalmente dedicados a filmes e sua vida pessoal andava meio vazia, sem propósito e com um casamento condenado. A indústria fonográfica queria porque queria armar o grande retorno do Rei aos palcos. Era o começo do Elvis gordo e doente, que acabaria morrendo apenas 4 anos depois.
A situação do Elvis no começo de 1973 era a seguinte: por uma obrigação contratual com a RCA Records, Elvis precisava criar material novo, o que não estava nem um pouco a fim de fazer. Marty Lacker, um amigo pessoal, conseguiu animá-l0 ajudando a embalar tudo em um pacote que incluia a venda de todas as suas músicas para a gravadora (por 6 milhões de dólares, o que hoje é dinheiro de Start-ups), uma ajuda na papelada do divórcio e uma volta para Memphis, sua cidade natal, para gravar o material que quisesse na famosa Stax, onde tantos craques como Otis Redding, Isaac Hayes e outros fizeram a soul music na década anterior.
Elvis topou.
Na primeira sessão, em maio, roubaram o microfone pessoal dele. Hoje em dia eu não sei como é isso, mas naquela época os grandes artistas andavam com seus microfones como a gente anda com nossos smartphones: à mão o tempo todo. Foi um mal começo e a sessão foi abortada antes de terminar.
Mas os meses foram passando, o divórcio saiu, a venda das músicas foi concluída e naquele mes de dezembro Elvis se sentia, pela primeira vez em muitos e muitos anos, livre. Livre das imposições da indústria fonográfica e do cinema, livre da mulher, livre de tudo o que o aprisionava. E foi assim que pisou no estúdio onde os melhores músicos da época o esperavam. Entre eles, o baixista Norbert Putnam, que tocou com Elvis na época agitada do rock, anterior aos filmes.
“Quando ele chegou eu reparei que tinha ganhado um pouco de peso e caminhava um pouco mais lentamente do que antes. Começamos com uma música antiga do Chuck Berry e ele simplesmente foi tomando vida e mergulhou na música”
Foi uma catarse. Foi como se Elvis estivesse se reencontrando com um velho amigo: ele mesmo. Apesar de toda a confusnao em que se transformou sua vida, a música continuava sendo o seu porto-seguro. E foi assim que, acompanhado dos melhores músicos, das melhores backing-vocals do soul e do gospel, que Elvis gravou dezenas e dezenas de takes de músicas escolhidas por ele, que misturavam todas as suas influências country, gospel e Rock and Roll com um delicioso tempero funk-soul. Elvis magro, gordo, branquelo, negão… tudo junto.
E no ano passado a RCA finalmente lançou esse material sem cortes e com tudo o que rolava no estúdio. Um registro obrigatório para entender porque o Elvis foi esse fenômeno gigantesco, afinal, era o seu carisma e sua entrega à música e alto astral com os músicos é que davam a aura genuína que sempre fez parte da sua carreira apesar de tanta gente querendo se aproveitar disso comercialmente.
Enfim, uma história para trazer contexto a esta sessão mágica, de dezembro de 73 em que o Elvis, munido dos melhores músicos da Stax, conseguiu fazer uma jam session com ele mesmo por algumas horas.
Fone bom, volume e play.
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