Quem vê o nascimento de um rio não esquece. E lá estava você, nascente, miúda, bem diante dos meus olhos. Que privilégio – o meu. A nascente miúda, um esconderijo do futuro, do que está por vir, deitada no chão, refletindo um fiapo do céu. Aceito seu convite, vamos, por onde é?, pergunto. Você pede para que eu a siga. Aceito o convite. Lá vou eu, à sua margem, vendo a pequena fonte crescer e crescer e crescer a cada passo. Descubro a fúria com que suas águas furam as pedras, cavam novos rumos com profundidade, desbravam terras e matas densas, escalam pedras, inconformam-se com o curso anterior e logo você traça outro, para deslizar suavemente. A chuva vem e você se alimenta dela. Mas adiante seca um pouco, de tristeza. Chora um afluente, mas passa. Quando temo que você irá sumir, vem a correnteza intensa. Você se renova. E cai do topo de uma montanha, desenhando um longo véu branco esfumaçado, até um novo recomeço, lá embaixo. Você segue, você não para. No meio do caminho, a grande calmaria me recorda o espelho da agora distante – e ainda mais miúda – nascente. Você está gigante. Deitada, uma imensidão, reflete todo o céu. Já não sei distinguir o que é maior: se a imagem em si ou o reflexo dela, em você. Pergunto se você consegue se ver, ali. Não. Mas já não importa. Você quer apenas seguir seu curso e desaguar no mar. Vai, Jules. Vai que eu fico aqui, admirado, como quem viu um rio nascer.
[nota do autor]
Juliana de Faria é uma das idealizadoras do Think Olga e da campanha Chega de Fiu-Fiu, que combate o assédio sexual e outras formas de violência contra a mulher. Veio a Austin, ao SXSW 2015, como palestrante. É uma importante representante brasileira numa luta árdua – e mundial. Uma importante voz a ser ouvida.
*Pedrinho Fonseca é convidado especial do Update or Die e do banco Santander durante o SXSW e veio a Austin com uma missão. Trazer um banco vermelho e convidar pessoas a sentarem nele. A contarem suas histórias. E, assim, descobrir um #bancodeinspirações.
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