Orange is the new Capricho?

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post de Francine Bittencourt, redatora publicitária.

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Finalmente estamos de novo em Litchfield.

Posso ouvir daqui as milhões de pipocas estourando por aí como se fosse uma grande celebração.

Elas voltaram.

Taí uma espera que machuca o coração da gente.

A série é um sucesso absoluto (ainda que o Emmy não concorde), e é um suplício esperar um ano inteirinho por esse reencontro.

Mas a volta dessa temporada me trouxe uma reflexão maior.

Não sobre elas, mas sobre nós.

Acompanhei a histeria e ansiedade que a espera da série causou nas redes sociais.

A filha de uma amiga de 13 anos implorou para faltar aula no dia em que o Netflix liberou todos os episódios.

Muitas faltaram.

Só se falava disso.

Eu cogitei simular um desmaio, mas estou bem longe de ser adolescente e com muitas contas para pagar, logo, o desmaio foi cancelado.

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Mas me chamou muito a atenção a idade das meninas apaixonadas pela série. Principalmente por conta da complexidade da maioria dos temas abordados.

E a cena escolhida para ilustrar onde quero chegar só poderia ser uma. É nela que encontramos o diálogo mais genial do episódio e, provavelmente, de toda a temporada.

É  dia das mães, e as detentas esperam para receber seus filhos em uma festa na prisão. Esse é um excelente ponto de partida para a série fazer o seu melhor: desenvolver assuntos polêmicos e doloridos de forma delicada.

Enquanto todas as detentas se encontram com filhas e mães numa festa no pátio, a personagem de Tiffanny Dogget (Caipira)  participa de um funeral particular que ela organizou para os seus seis bebês abortados. A loucura é tanta, que ela chama cada um pelo nome e serve um copinho de refrigerante para cada um deles, pedindo desculpas por não ter conseguido ser a mãe que eles mereciam.

Nisso chega Big Boo (minha preferida) pronta para protagonizar um dos grandes momentos. Para consolá-la joga na roda a teoria (bastante controversa)  do best-seller “Freaknomics”:

Big Boo: Já leu o livro Freaknomics?

Pennsatucky: Não. É sobre mulheres barbadas e anões?

Big Boo: Quase. É sobre a teoria econômica. Causa e efeito.

Pennsatucky: Parece chato.

Big Boo: É uma boa leitura. Tem um capítulo chamado “ Onde foram parar os criminosos”. Na década de 1990, o crime diminuiu drasticamente e o livro atribui isso à legalização do aborto.  

Pennsatucky: A escuridão de 1973.

Big Boo: É o contrário, na verdade. Os abortos ocorridos após a legalização eram crianças indesejadas. Crianças que, se suas mães forçadas a ter, terminariam pobres, negligenciadas e maltratadas, os três ingredientes mais importantes para se produzir um criminoso.  Só que elas não nasceram. Então, 20 anos depois, quando estariam no auge do crime, eles não existiam. E a taxa de criminalidade diminuiu drasticamente.   

Pennsatucky: O que você quer dizer?

Big Boo: Quero dizer que você era uma” bostinha” entupida de metanfetamina, e se seus filhos tivessem nascido, também seriam bostinhas entupidas de metanfetamina.  Ao interromper estas gestações você poupou a sociedade do flagelo da sua prole.

Pennsatucky: Nunca tinha pensado dessa forma.

Big Boo: Talvez você deva pensar. E parar de punir a si mesma.

Nocaute absoluto.

1Tiffany

Não estou defendendo, concordando e nem discordando.

Só estou refletindo sobre o que foi dito na cena, dentro de um contexto arrebatador.

Do ponto de vista de roteiro é magnífico.

Fica claro que a autora Jenji Kohan não mede esforços para expor a sua posição sobre a legalização do aborto, drogas e, especialmente, preconceito e homofobia.

O que me dá a impressão, às vezes, que a série está a serviço dos temas, e não os temas a serviço da série.

O que, na verdade, não faz a menor diferença, porque o resultado sempre é brilhante.

Lembrei da minha adolescência lendo a Capricho.

Não havia discussão.

Alguns assuntos não era possível sequer pensar a respeito. Quanto mais debater.

Era errado e acabou.

Mas não quero entrar no mérito de certo ou errado, e sim defender esse debate extremamente pertinente que a série cria a cada novo diálogo.

Penso nessas meninas de 13 anos assistindo a tudo isso e sinto, além de uma certa inveja, uma enorme felicidade.

Go, Orange. Obrigada por ter tanto a nos oferecer.

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