Se tem uma coisa que não está, é fácil.

por Cristiano Landa Prado

Quando os diários eram privados e os encontros e conversas eram ao vivo, compartilhar sentimentos, episódios ou pensamentos era também íntimo. Até que em um belo dia surgiram internet, fóruns, Facebook, Twitter, Instagram, Snapchat etc etc etc e aí sim, a gente conseguiu ver e ouvir o que o mundo — coletivamente — andava sentindo e dizendo (e reclamando).

A internet não só conseguiu aproximar pessoas, como também construiu ambientes confortáveis, amplos, escaláveis e razoavelmente simpáticos para se compartilharem sentidos e sentimentos que antes tendiam ao privado. A gente — pessoas — meio que entendeu isso e, achando que a internet fosse (será que é?) o sofá de casa, foi se jogando, gostando, e decidindo não sair nunca mais.

E do sofá de casa ou largado na cama,  começamos a falar e falar e falar. E descobrimos, magicamente, que outras pessoas também falavam sobre as mesmas coisas. Não aqueles amigos próximos e super parecidos, mas uma galera desconhecida, de qualquer parte do país ou do mundo. Exemplos gigantes disso são os memes, que expuseram e expõem contextos antes segredados e que se tornam hoje meio de identificação e pertencimento entre milhares de pessoas.

Mas o ponto mais louco disso é que, seja num meme ou só mesmo reparando o feed das redes sociais, a gente começa a perceber a mensagem que as pessoas como um todo, parecem querer dizer. E ao meu ver, isso tem sido assustador.

Hoje, se você entrar no Twitter, o que mais encontrar são lamentos. “A vida não está fácil”, “Queria estar morta” e por aí vai. É a voz compartilhada de um lamento meio urgenciado, cuja reincidência aponta para uma situação generalizada e que muito possivelmente está suportada por uma insatisfação também coletiva de toda uma geração. “Ah, mas que exagero!” Será?

tumblr_mavlgyTjfi1ro5kqeo1_500Os “memes” que fazem humor com o triste, com o desagradável, com o pessimista, com a coincidência ruim, hoje parecem sintomáticos de uma realidade em que talvez as pessoas mais vivam do que estejam satisfeitas com o viver. Não é abdicar de experiências boas ou sensações extraordinárias — pelo contrário, inclusive, os excessos e as experimentações permanecem e se multiplicam. Muitíssimas vezes, inclusive, motivados por uma necessidade de transbordamento, de escape, de esquecimento do cotidiano entediante.

JÁ QUE A VIDA NÃO TÁ FÁCIL, NÉ?!

Mas o que se percebe é que, num todo, o movimento é de uma paciência necessária, de resiliência. Um esforço enorme em resistir. Emocional, física, financeira e psicologicamente. É uma vida cheia de “apesar”. Ou então um gosto muito estranho por teatralizar uma vida sempre #chateada e #bolada.

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https://www.facebook.com/mortivacional

Sim, tem hora que eu busco acreditar que o feed do Twitter seja uma realidade paralela em que todas as reclamações, decepções, desabafos são mais entretenimento (?) do que retrato do real. Caso contrário, talvez estejamos numa fase em que as alegrias parecem pouquíssimos presentes. Ou talvez nem a alegria, mas uma certa tranquilidade, paz, plenitude. Por que é que tem tanta gente reclamando?

“Ah, mas é que a geração X Y Z Millennials etc é assim mesmo. Ansiosa, preocupada, engajada e tal.” É isso mesmo? É sempre muito cômodo mandar a conta pra tal da “geração”, né. Talvez seja o formato do sistema de ensino, ou o formato dos empregos, ou influência do comportamento consumista sem limites, ou mesmo a própria ansiedade e impaciência multiplicada pelas tecnologias. Pode ser muita coisa.

Até fiquei pensando: mas, cara, no Instagram todo mundo é feliz. Então seria o caso de a gente alocar felicidade e tristeza em plataformas diferentes, e aí no fim das contas está tudo equilibrado? Infelizmente, acho que não.

Instagram é feito pra ser bonito. Tem filtro, tem ajuste de foto, tem desafios de fotografia pelo próprio Instagram. Lá a gente é levado a deixar tudo lindo. Assim como Pinterest, Ello, Behance, 500px, etc. Mas nos lugares em que se preza a espontaneidade, transparência, imediato, retrato-captura do agora, o bicho pega. E todos choram.

Pra variar, tudo tem aquela palavra-madrinha das internets: a zoeira empatia. Não é só se identificar, mas também, de alguma forma, estar confortável pra se expor e pra ser amparado. Lá todo mundo xinga. O “eu também” fortalece demais, e tudo isso pode acabar sendo terapêutico. E será que essa terapia funciona?

E pra terminar, fico lembrando das imagens motivacionais e coloridas e felizes que as tias, mães e avós amam enviar nos grupos da família e publicar nos Facebooks da vida. Mas talvez elas só não tenham descoberto o Twitter ainda, né?

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