Coisas que só se aprende longe de casa

Hoje, dia 5 de julho de 2016, completo dois meses após o início do processo de desligamento do quadro de funcionário lá de casa. O local para homologação ficava localizado no aeroporto de Guarulhos, e o horário previsto para liberação estava marcado para 23:30. De Guarulhos para Londres, de Londres para Dublin.

A recepção não poderia ter sido melhor. Era da escola para festa, da festa para escola. De segunda a segunda, sem descanso.

“Dormir? Sério? Hoje é dia de Dicey’s com pint a dois euros. Ah, e vê se não esquece da after lá em casa. Ali na Monjoy, sabe?”

Estava bom demais para ser verdade. Não demorou tanto tempo para semana dos sonhos dizer adeus e dar espaço para outra não tão boa assim. O prazo para encontrar uma casa era curto, os euros desapareciam, assim como as lembranças das noites anteriores, também. E ainda por cima, fazer mágica para entender o que as pessoas falavam na rua não era das tarefas mais fáceis. Pelo contrário, era mais difícil do que imaginava. Fora outras questões como: lavar roupa, fazer comida e limpar a casa, que para mim, eram coisas que nem dariam tanto trabalho assim. Inocente.

De uma hora para outra, o ideal de perfeito se transformava aos poucos em saudade do mundo comum, no qual, tinha escolhido deixar de lado por um tempo.

As festas não tinham mais a mesma graça, a aula era chata, o arroz se não queimava, ficava papado, e ter que dividir quarto com outras pessoas me fazia pensar o quão bom era o quarto single e organizado do Brasil. Até o frio levou culpa nessa. A Badtrip era das boas. Daquelas que nem o sono cura, sabe?

Mais uns dias se foram e nada daquelas coisas saírem da cabeça. Foi aí que depois de mais um dia cheio de coisas pra resolver, algo meio diferente aconteceu. Estava sentando num banco perto da porta de entrada do hostel que morei por um tempo, quando um velhinho sentou do me lado, acendeu um cigarro e começou a falar palavras que num primeiro momento me deixaram atordoado. Não era inglês, muito menos português. Ele era romeno, tinha 60 anos, e mesmo vivendo em Dublin há anos, falava apenas a língua materna, na qual eu não sabia um caralho. Por mais difícil que estivesse a comunicação entre nós, por algum motivo ele insistia em querer conversar. Sentia que ele queria me ajudar de alguma forma. Descobri o que ele fazia na Romênia, aprendi várias palavras, vi fotos da filha e da esposa, fumamos cigarros romenos, e até conselhos sobre a vida eu ganhei aquele dia. Não falávamos a mesma língua, mas por incrível que pareça, o papo rendeu um bom tempo.

Logo depois que cheguei no quarto, refleti sobre aquilo, e foi naquele momento que as coisas ficaram mais claras. Me fez questionar se realmente os aprendizados mais importantes dessa experiência eram os das coisas que eu esperava ter por aqui. E então, cheguei a conclusão de que talvez, os ensinamento mais ricos estavam nas poucas e surpreendentes coisas que aconteciam no dia-a-dia. Situações que de fato me tiravam daquele mundo comum que eu andava sentindo saudade. Mais que aprender o inglês e aproveitar no hard cada momento, outras coisas, que talvez até mais importantes, estavam inclusas no pacote. É, meus queridos, a coisa não é tão simples assim. Muito pelo contrário. Mergulhar em uma experiência como essa é muito mais que fazer festa e aprender outro idioma. O negócio é mais embaixo.

Se você, assim como eu, está acostumado a chegar em casa, ter roupa limpa, comida no prato, dinheiro na conta e um quarto single, não se acanhe e junte-se a nós. Estaremos esperando de braços abertos. Tanto para as festas, claro, mas também para o resto das outras coisas que com certeza atormentarão no começo, mas que no final, se tornarão em grandes lições para o resto da vida.

Confia no que estou falando. Esse treco é bem maior do que parece. Ele vai te mudar da noite para o dia. Pode parecer bobagem, mas se você acha que já anda com as próprias pernas, talvez você esteja enganado, ou apenas tenha uma visão um pouco distorcida do verdadeiro significado do que isso representa.

E para finalizar, saibam que aquela badtrip não passou por completo. Não por causa das dificuldades que se tem morando longe de casa, mas sim, por ter esperado tanto tempo para descobrir a dimensão que a vida pode ter aqui fora.

Cheers!

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