Antigas formas de aprender

Antes da calculadora científica, da HP12C e do Excel, se usava o ábaco. É um antigo instrumento, formado por uma moldura com bastões ou arames paralelos, dispostos no sentido vertical, cada um deles correspondendo a uma posição digital – unidade, dezena, milhar e por aí vai. Durante milênios, ensinou seres-humanos em diferentes partes do mundo a calcular. Era um equipamento verdadeiramente universal (em uma época em que se chegar a qualquer canto do mundo levava, literalmente, anos. Surpreendentemente, o ábaco sobreviveu como calculadora até o início do século XXI – a China, o último país a removê-lo do seu currículo escolar, o fez somente em 2001.

Em 2010, a pesquisadora Chen Feiyan e seus colegas do departamento de física da Universidade de Zhejiang, conduziram uma pesquisa com estudantes de 200 colégios para medir se o ábaco fazia falta ou não. Descobriu que aqueles que sabiam utilizá-lo, tiravam notas mais altas.

Apesar do pouco uso do ábaco na sociedade moderna, algumas instituições de ensino chinesas, como o grupo Shenmo, decidiram reintroduzir o ensino do instrumento, oferecendo cursos específicos ligados ao currículo de aritmética. A sua “força” está em ajudar quem o usa, a “visualizar” problemas abstratos. Ao aproximá-los do nosso “mundo de carne e osso” por meio de um instrumento físico, o ábaco facilita a compreensão do seu conceito e, em um segundo momento, a sua abstração em nosso cérebro (para um melhor entendimento de como as diferentes regiões do cérebro influenciam no aprendizado, recomendo uma visita ao Brain Map, página interativa da organização OpenColleges).

Em um ensaio publicado na revista “The American Scholar” em 2008, o especialista em literatura, Ernest Blum, chama a atenção para o fato de que “o número de palavras necessárias para ler livros em uma língua estrangeira, excede em vários múltiplos, a quantidade de vocabulário adquirido pela maioria dos estudantes desta língua estrangeira”. Segundo Blum, essa enorme lacuna de vocabulário explica porque, mesmo após anos de curso, muitos ainda dependam fortemente de dicionários e traduções para compreenderem textos em outro idioma.

Blum defende a volta de um método, bastante utilizado nas idades antiga e média para o aprendizado de latim e grego, chamado de tradução das entrelinhas (também é conhecido como tradução interlinear). Neste método, o foco do estudo é o texto e não a gramático.  Palavras, frases e parágrafos são “dissecados” para a compreensão do seu sentido. Outro fã do método, é o professor de história da renascença da Universidade de Leeds, Robert Black, que estudou cerca de 300 “livros didáticos” utilizados em Florença entre os séculos XII e XV, e descobriu que a tradução das entrelinhas fornecia sinônimos, explicava a ordem das palavras e a gramática em termos “modernos” (modernos para a época), destrinchava as figuras de linguagem e suplementava palavras “sem tradução”, as substituindo pelo seu sentido.

Houve uma “tentativa” de reintroduzir o método ao aprendizado de línguas por volta do século XIX, mas foi rejeitado pelos gramáticos da época, que argumentavam que focar no sentido do texto, desconsiderava a gramática e a composição. Para eles, o sentido deveria ser suplementado pelo próprio estudante, com a ajuda de um dicionário.

O exemplo do ábaco e do método da tradução das entrelinhas, mostra que o que é antigo nem sempre é desatualizado. Há muita tentação em simplesmente substituir algo “velho” por uma nova tecnologia (ou modelo), mas a verdade é que o novo, deve ser encarado como uma adição e não substituição. Desta forma, é possível preservar o que comprovadamente dá resultado (e passou pelo “teste do tempo”) e estimular a introdução de novas práticas que, somadas às antigas, efetivamente vão colaborar para o enriquecimento do aprendizado humano.

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