Big Brother corporativo

A empresa em que você trabalha te deu um smartphone. Você está dando uma checada nele quando percebe um daqueles e-mails do LinkedIn: “estas empresas estão procurando candidatos como você”. Apesar de não estar particularmente interessado(a) em algo, mas sempre aberto(a) a oportunidades – e um tanto quanto curioso(a) – você clica no link. Alguns minutos depois, seu chefe aparece na sua mesa e diz: “notamos que você tem passado mais tempo no LinkedIn ultimamente, vamos conversar a respeito da sua carreira e se está feliz conosco”?

É um cenário digno de big brother, mas não tão improvável. É sabido que o custo de se trocar um funcionário nunca é barato (nem o de mantê-lo), mas em muitos setores, o custo de se perder bons funcionários está incrivelmente maior por conta da natureza cada vez mais colaborativa dos postos de trabalho. Este é inclusive um dos efeitos colaterais do trabalho em equipe, quando se forma uma “bem azeitada”, não é nada trivial trocar um “jogador”. Desta forma, é até natural que empresas intensifiquem seus esforços em prever os riscos de algum funcionário “abandonar o barco”. As táticas usadas variam da pura e simples “espionagem” a análises de padrões de atividade em rede sociais.

Não quero entrar em discussões a respeito da moralidade da prática ou mesmo da sua legalidade. Em muitos sentidos, os dados gerados na internet ainda são (e talvez o sejam por muito tempo) como “águas internacionais” – pode-se até envolver algum tipo legislação para tentar regular sua utilização – mas é incrivelmente difícil garantir a sua efetiva aplicação. Sem contar ainda com os dados produzidos dentro de uma organização – que indiscutivelmente são dela. O ponto que gostaria de abordar gira em torno dos métodos e medidas que um número cada vez maior de empresas tem tomado para identificar os riscos de se perder um “colaborador”.

As principais razões têm-se mantido estáveis por anos: problemas com os chefes; falta de oportunidade de crescimento; um emprego mais desafiador ou melhor salário. Uma nova pesquisa, conduzida pela CEB – uma empresa de pesquisa tecnológica – com sede em Washington, decidiu focar sua análise não apenas no “por que”, mas também no “quando”. Segundo o diretor da empresa, Brian Kropp, o que estimula alguém a querer mudar de emprego é a comparação que a pessoa faz de como está em relação aos seus conhecidos ou então como deseja estar em determinado momento da vida. O interessa da CEB era saber quais momentos estimulavam a comparação.

Algumas descobertas não trazem muitas surpresas, “aniversários de empresa” (antigamente conhecido como “tempo de casa”) são momentos naturais para reflexões e o aumento de 6% a 9% na procura de novos empregos nesta época confirmam a crença. Momentos sem ligação direta com o trabalho também são incentivos para autoavaliações, como aniversários – principalmente de números redondos, como 40 ou 50 anos – aumento de 12% na procura. Encontros de turma (colégio, faculdade, etc.) também incentivam a busca por “novas oportunidades” (aumento de 16%).

Voltando ao monitoramento, a maior possibilidade de acesso à gigantesca quantidade de dados que produzimos diariamente (o cada vez mais famoso big data) e em especial ao que é conhecido como dark data – que de maneira similar à “matéria escura” da física, constitui a maior parte dos dados de qualquer organização e que quase nenhuma delas se interessava em conhecer – tem permitido identificar possíveis padrões de comportamento de funcionários que pensam em sair. O já citado e-mail LinkedIn é um exemplo. Outro comum é o monitoramento do crachá (conhecido como badge swipe), que verifica o uso do crachá para entrada e saída do prédio (ou da garagem) e identifica padrões que possam sugerir uma “escapada” para entrevista. Se parece exagero a princípio, saiba que algumas empresas, como a Jobrate, têm se especializado neste tipo de análise e prestam consultoria para inúmeras multinacionais. Grandes investidores também têm baseado suas estratégias de investimento levando em conta informações que sugerem mudanças em posições chave nas empresas as quais estão interessados.

Uma perspectiva bem tensa, não? Mas é preciso se lembrar que nem tudo deve ser encarado como “teoria da conspiração”. É claro que as informações podem ser usadas em relações de “mais valia” (esta tirei do fundo da cartola), afinal estamos lidando com seres-humanos, mas não é este o enfoque. Empresas como a Credit Suisse, usa suas informações para melhorar seu relacionamento com funcionários “insatisfeitos”. Como base nelas, por exemplo, avisa funcionários sobre vagas disponíveis em outros setores ou a respeito de oportunidades internas. Com isto, a empresa estima ter economizado de US$ 75 milhões a US$ 100 milhões em custos de recrutamento, seleção e treinamento, somente em 2014.

Ações preventivas para se manter um funcionário parecem ser um “melhor negócio” do que, por exemplo, esperar “a coisa acontecer” e fazer uma contraoferta. Os dados da CEB mostram que cerca de 50% dos funcionários que decidem ficar por conta de uma contraoferta, acabam saindo nos 12 meses seguintes. A maneira como as informações geradas por estas análises de dados está sendo utilizada atualmente, sugere que o big brother é invertido. Manter na casa ao invés de eliminar.

 Fonte: pesquisa CEB, “The New Path Forward: Creating Compelling Careers for Employees and Organizations,”

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