Amores assíncronos

Mais informação disponível não significa mais tempo para consumi-la. A alternância entre a sincronicidade e a assincronicidade da comunicação é um equilíbrio interessante de ser mantido. A conversa cara-a-cara (síncrona) versus bilhetes enviados através de mensageiros a cavalos (assíncrona), do primeiro email (em 1971) aos mensageiros instantâneos (IRC, ICQ, MSN Messenger), que se tornaram não tão ‘instantâneos’ (Seen on xx:xxh).

E, em tempos de Tinder, Happn, OkCupid e afins, os relacionamentos pessoais e amorosos também lutam para encontrar o equilíbrio entre a interação imediata, demandando maior velocidade de raciocínio, e o prudente tempo de resposta que nos permitem as ferramentas de comunicação digital.

 
Online Dating

O medo da rejeição e a redução da capacidade em se lidar com o processamento e resposta instantâneos transpôs para os meios digitais assíncronos boa parte das relações humanas.

O diálogo abaixo entre um casal de adolescentes que haviam acabado de se encontrar, descompromissadamente escutado em um corredor de shopping,

- Qual seu celular?

- Ah, é NOVE-8455-xxxx...

- Tá bom, te mando um WhatsApp.

O que haveria de tão urgente neste shopping que os impediria de se comunicar ali, frente à frente, olho no olho? Ou, “beijo, me liga”?.

A sincronicidade da comunicação é muito mais arriscada. Exige um grau de concentração/foco, capacidade de raciocínio e agilidade de pensamento linear (para construção da melhor resposta a um questionamento, por exemplo) que estão cada vez mais raros hoje em dia, justamente pelo pensamento agora funcionar como hyperlinks, onde as conexões não necessariamente pertencem ao mesmo grupo repertorial.

A jornalista Carol Nogueira cunhou o apelido “geração DDA” para ilustrar a perda desta capacidade argumentativa em função da incrível quantidade de estímulos simultâneos a que cada um de nós está exposto hoje em dia.

Notification

Obviamente esta reconfiguração do cérebro não passaria incólume na maneira como as pessoas se comunicam e, sobretudo, nos relacionamentos amorosos. E isto abriu uma avenida de oportunidades para sites e aplicativos que promovem o match-making pessoal. A questão aqui não é criticá-los ou subverter o que já está consolidado, mas atentar a como seu funcionamento está adaptado à forma de consumo de qualquer conteúdo hoje em dia.

Como em um jogo, estas ferramentas estimulam o inesperado (deu match!), a projeção da conquista e de um futuro hipotético ao lado de alguém cuja intimidade foi formada a partir de uma sequência de fotos, o gerenciamento da ansiedade causada pelo aumento do tempo entre pergunta e resposta.

O desafio da conquista não passa mais, unicamente, pela argumentação instantânea; por um lado conta agora com a necessidade de saber administrar o vácuo comunicacional – quanto tempo depois devo responder? – e, por outro, oferece aos interlocutores um maior tempo de processamento da informação e preparação da resposta, o que, de certa forma, concorre com os múltiplos estímulos a que somos expostos.

A dopamina liberada pela ansiedade da espera seguida de um sinal de notificação entorpe o já ultra estimulado cérebro contemporâneo em uma relação amorosa assíncrona e o prazer fragmentado pelas pequenas recompensas em forma de ícones faz com que a paixão a cada clique seja mais forte que um amor à primeira vista.

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