Trocadilhos.
Aquele jogo de palavras parecidas no som mas diferentes no significado que sempre dão margem para duplas interpretações.
Sim, ao contrário do que muita gente pensa, fazer trocadilhos é uma arte. É preciso talento para costurar com maestria 2 palavras e criar um terceiro significado. Até mesmo os trocadilhos infames demandam um certo dom.
E convenhamos…todos nós já fizemos algum trocadilho na vida. E se você ainda não fez, vai fazer.
O primeiro trocadilho pode aparecer muito cedo na vida de uma pessoa. Normalmente é apresentada por um tio bêbado no casamento da prima quando, na mesa de sobremesas, ele solta o clássico: “É pavê ou pácomê?”
Nesse momento, somente os não iniciados na arte dos trocadilhos acharão graça, já que seu repertório ainda é raso e estão apenas descobrindo as infinitas possibilidades dessa fabulosa ferramenta social. Mas, nesse momento, a vida se divide, a mente se expande e tudo, absolutamente tudo, passa a ser percebido com uma segunda intenção.
Mas não ache que trocadilhos são todos iguais. Assim como existem os gêneros literários, também podemos classificar os trocadilhos por categorias. E cada uma serve perfeitamente a uma ocasião.
Vou listar apenas algumas para exemplificar.
O tipo mais básico é o Trocadilho Direto, aquele que, com apenas uma palavra, já dá conta do recado. Normalmente iniciamos a carreira por ele, por serem mais fáceis de criar, contar e entender:
“Comecei a usar lapiseira e meu lápis ficou desapontado.”
“Esse negócio de colocar piercing é a maior furada.”
“Alpinistas no Everest a gente encontra aos montes.”
Existe também o Trocadilho Tudo e Todos, que apesar de ser infantilizado, é um clássico que nunca sai de moda:
“Todo mundo ama, até o fliperama.”
“Tudo na vida passa, até a uva passa.”
“Tudo na vida muda, até a bermuda.”
Tem o Trocadilho Midiático, aquele que precisa do gancho de uma personalidade para acontecer:
“Meu filho volta pra casa ao anoitecer, o Seu Madruga.”
“O Ronaldo enche o copo e o Valderrama.”
“Errei 5 questões na prova, o Cacá Rosset.”
Tem também os do tipo Manchete, os meus favoritos. Aqueles que são tão elaborados que mais parecem matéria do Zero Hora:
“Guarda-roupas cai na Marginal Pinheiros e provoca engavetamento.”
“Barco é multado por transportar laranjas no Rio Solimões.”
“Papai Noel é assassinado por duendes e não está mais em-trenós.”
Um dos mais utilizados é o Trocadilho Questionador, aquele que vem em formato de pergunta e está pronto para causar na resposta:
“- Sabe por que a cocaína está sempre presente em festas da alta sociedade?
– Porque ela é uma droga muito refinada.”
“- Quem ganharia uma maratona de eletrodomésticos?
– O chuveiro, porque tem resistência.”
“- Por que a costureira faz crochê?
– Para garantir a renda.”
Um dos mais inteligentes é o Trocadilho Explicador que, como o próprio nome sugere, explica uma ideia:
“Quem tem rinite alérgica não deve lutar capoeira.”
“Durante o feriado, as lojas de moda fashion.”
“Jardineiro que é esperto, só compra apartamento na planta.”
Há ainda o Trocadilho Magda Antibes, que erra a palavra, mas acerta no significado:
“Meu gato morreu em miados do ano passado.”
“Colocaram uma cama elástica no Polo Norte só para o urso polar.”
“A placa-mãe causou curto no fio.”
Eu sou um profissional do trocadilho. Comecei cedo, influenciado por 2 gerações de trocadilheiros de mão cheia, meu pai e meu avô. Não havia um só evento em família que passasse em branco: aniversários, casamentos, velórios, Natal. Qualquer que fosse a ocasião, vinha carregada de matéria-prima para um verdadeiro duelo de tenções dobradas.
Talvez isso explique essa minha necessidade quase doentia de fazer trocadilhos em qualquer lugar, a todo momento.
Claro, nem sempre dá certo.
O mais maluco é que não sou só eu. Vivemos uma verdadeira epidemia de trocadilhos, impulsionada até mesmo pela publicidade. Muitas agências e criativos usam desse talento na construção de marcas, produtos, assinaturas, chamadas, títulos, anúncios e, claro, campanhas políticas, brindando o público com pérolas como essas:
Eu mesmo já cheguei ao ponto de fazer títulos publicitários e slogans com trocadilhos que nem sei como foram aprovados pelo cliente.
“Café Magno Fruto. Até a Dona Xícara admirou-se.”
“Jiyuu Sushi. A Rua é dos Estudantes, mas os pratos são de Mestre.”
“Nextel. Não faça #FAIL nas redes sociais.”
Como deu pra perceber, fazer trocadilhos demanda muito estudo, prática e aperfeiçoamento constante. Mas a boa notícia é que todos podem fazer.
E para incentivá-los na busca pelo trocadilho perfeito, deixo aqui um dos mais inspiradores já vistos: