#MulheresNaArte: vingança em tinta a óleo

A mostra “Beyond Caravaggio” (“Além de Caravaggio”) está em cartaz na National Gallery, em Londres, com uma coleção de obras de rivais e discípulos do mestre barroco. Uma das obras que mais chama a atenção é, sem dúvida, Judite decapitando Holofernes, de 1620. A cena bíblica também foi pintada por Caravaggio e Goya, mas a versão de que estamos falando é a da pintora barroca Artemísia Gentileschi. Nela, Judite, com sua ajudante, decapita o general Holofernes enquanto este dormia bêbado. A cena pintada por Gentileschi transmite uma expressão física e uma determinação que não existem em outras interpretações.

Judite decapitando Holofernes
Judite decapitando Holofernes

Gentileschi, nascida em 1593, é considerada a maior artista do período barroco, sendo a primeira mulher a ser admitida na Accademia di Arte del Disegno em Florença – em uma época em que o mundo das artes estava muito, muito longe de abrir as portas para artistas mulheres. Seu pai, o pintor Orazio Gentileschi, foi muito influenciado pelo trabalho de Caravaggio, o que terminou por influenciar a obra da filha.

Mal sabiam eles que alguns eventos influenciariam ainda mais o seu trabalho. Quando ela tinha em torno de 17 anos, Orazio contrata um tutor para Artemisia, Agostino Tassi. Durante a tutela, Artemisia é estuprada por Tassi e, um outro homem, Cosimo Quorlis, também estava envolvido. Na esperança de que um casamento fosse restaurar sua honra, Gentileschi continua tendo relações com Tassi. Quando, nove meses depois, Tassi se recusa a se casar com ela, seu pai o processa.

Esse é então o começo de um longo e doloroso período que vai marcar a artista para sempre: o julgamento leva sete meses, e nele não é Tassi quem passa por procedimentos cruéis e constrangedores: Gentileschi, então com 18 anos, é submetida a exames ginecológicos e tortura para averiguar se os fatos eram verdadeiros. Tassi foi condenado a um ano de prisão mas nunca cumpriu toda a pena. Todo o processo termina por influenciar profundamente sua visão sobre o feminismo e a opressão à qual as mulheres eram submetidas.

Gentileschi termina pouco depois deste momento sua versão de Susana e os Anciãos – outra obra presente em Beyond Caravaggio -, que mostra claramente a aversão e repulsa de Susana à aproximação dos anciãos, que, na versão da artista é escancarada e invasiva. Numa manifestação clara do impacto dos eventos e da impunidade, sua interpretação é muito diferente das de outros artistas homens, que pintam os anciãos mais discretos e, Susana, mais receptiva.

Susana e os Anciãos, a primeira obra atribuída a Gentileschi, 1610
Susana e os Anciãos, a primeira obra atribuída a Gentileschi, 1610

Carregando uma desonra em uma época em que reputação era tudo, Gentileschi pintou muitas mulheres fortes e sofredoras – fez disso sua especialidade, pintando mitos e cenas bíblicas. Canalizando a raiva e a injustiça para fazer do seu trabalho visceral um dos mais famosos da Europa na época, ela usa as imagens para retratar a opressão e violência imposta contra as mulheres.

Para saber mais sobre Artemisia Gentileschi, leia este artigo (em inglês) no The Guardian e veja sua obra completa aqui.

 

 

 

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