UX e o 道 Tao

Sobre a dificuldade em explicar e definir o que é UX

Se você trabalha com UX, é bem provável que já sentiu dificuldade em explicar para alguém o que UX é de verdade.

O que é UX?
Uma disciplina? Uma filosofia? Um método? Uma maneira de pensar? Um modo de ver? Uma arte? Uma técnica? Uma abordagem?

UX é aquela coisa que você sabe o que é, mas não consegue explicar e colocar em palavras, como se fosse algo que estivesse além das palavras. Temos que concordar que não é fácil responder a pergunta “O que é UX?”, seja para nós mesmos ou para um estranho que acabamos de conhecer numa festa, e isso é um fato.

Se você pesquisar por aí, obviamente existem inúmeras definições do termo, feitas por profissionais e designers renomados em diversas áreas, para citar algumas:

  1. “O Experiência do Usuário engloba todos os aspectos da interação do usuário final com a empresa, seus serviços e seu produto” Don Norman
  2. “Experiência do usuário é sobre como ele funciona do lado de fora, onde uma pessoa entra em contacto com ele e tem que trabalhar com ele. (…) No entanto, a cada produto que é usado por alguém tem uma experiência de usuário: jornal, garrafas de ketchup, poltrona reclinável, camisolas cardigan.” Jesse James Garret
  3. “Arte e a ciência de gerar emoções positivas entre as pessoas que interagem com produtos ou serviços” Tomer Sharon
  4. “O processo de aprimoramento da satisfação dos usuários, melhorando a usabilidade, a acessibilidade e o prazer providos na interação entre o usuário e o produto”. Wikipedia

Não sei pra vocês, mas para mim todas essas definições, por mais que tentem da melhor forma possível ser simples e sucintas, que tentem sintetizar o significado da “coisa” como um todo, ainda continuam muito abrangentes, abstratas e de certa forma subjetivas, além disso abordam muitos termos que remetem a diversas outras coisas e áreas do conhecimento — isso inevitavelmente cria essa complexidade e dificuldade em explicar e definir o que é UX.


Sobre a dificuldade em explicar e definir o que é o 道 Tao

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Luke e Darth Vader — Yin-Yang

Há alguns anos me interesso muito pelas leituras e estudos de Filosofia, principalmente as que vem do oriente. Nessas leituras tive a felicidade de me deparar com o clássico Tao Te Ching, escrito por Lao Tzu entre 350 e 250 a.C.

Mesmo não tendo nenhum contato prévio com este tema, se você mora no planeta Terra com certeza já se deparou com este símbolo não é mesmo? Pois é, este símbolo está diretamente relacionado ao Taoismo e seus fundamentos.

Como complemento deste artigo recomendo este vídeo do canal TED-Ed onde simbologia do Yin-Yang é abordada de forma clara e criativa:


Breve história de Lao Tzu 老子 e do Tao Te Ching 道德經

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Reza a lenda que, há milhares de anos na antiga China, Lao-Tzu resolveu cruzar a fronteira do território para se exilar nas montanhas e viver seus últimos anos de vida distante da cidade.

O soldado da fronteira, ao ver que o velho se tratava de um grande mestre, o obrigou a registrar/compartilhar seus conhecimentos e sua sabedoria de Vida, essa seria a moeda de troca para a passagem através da fronteira.

O resultado disso foi o livro Tao Te Ching, uma das mais conhecidas e importantes obras da literatura chinesa e mundial.

Na verdade, até hoje não há certeza se Lao Tzu realmente existiu de verdade ou não — de qualquer forma, este é um livro muito interessante além de ser considerado o pai das ideias Taoistas em todo o mundo.

Muitos criticos do budismo questionam se a figura de Buda realmente existiu, e como disse anteriormente o mesmo acontece com Lao Tzu.

Independente disso, acredito que o mais importante é a moral da história, o ensinamento em si, a mensagem, e não o fato de que a pessoa existiu realmente ou não. Além do mais, mesmo a pessoa não tendo existido, isso foi criado e partiu da mente humana, no mundo real, logo, isso existe e o mais importante é a essência da mensagem.

Em teoria, o livro Tao te Ching se propõe a explicar o que é o Tao 道, mas afinal, WTF is Tao?

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Caro leitor, é aí que começa o problema…

Abaixo duas definições do Tao 道 da Sociedade Taoista do Brasil:

  1. “Tao 道, que literalmente traduzido significa Caminho, exprime o conceito filosófico de Absoluto. Este conceito traz a idéia de origem, princípio e essência de todas as coisas. O Absoluto está além do tempo, do espaço e das linguagens. Sendo assim, não pode ser expresso, pois todas as expressões dependem de uma linguagem e de uma referência de tempo e espaço. Da mesma forma que não é possível usar uma régua para medir algo que está além das medidas, também não se pode utilizar a linguagem para descrever algo que está além da linguagem.”
  2. “Tao 道 — é a totalidade, incluindo o visível e o invisível, é o ser e o não-ser juntos. Tao, em chinês apresenta três sentidos, ao mesmo tempo: é “caminho”, é “caminhante” e a ação de caminhar; por conseqüência analógica, o Tao é, ao mesmo tempo, o Criador, o Criado e a criação. O Tao, como Criador, é o Vazio e a Forma, e a transformação que une os dois. Os Três são Um. O Tao não se limita em nome, forma, sentido, ou qualquer outra coisa; todas as coisas, no entanto, são parte do Tao e as formas do Tao se expressar.”

    Inúmeras correntes do pensamento religioso e filosófico no decorrer dos tempos atribuíram milhares de interpretações diferentes ao sentido do Tao Te Ching. Porém, a questão primordial do livro é localizada em seu primeiro parágrafo:

    “O Tao que pode ser dito não é o Tao Verdadeiro”.

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UX como ferramenta: polaridades, ética e moral

Ao pesquisar a etimologia da palavra Ferramenta na wikipedia, temos o seguinte resultado:

O termo ferramenta deriva do latim ferramenta, plural de ferramentum. É um utensílio, dispositivo, ou mecanismo físico ou intelectual utilizado por trabalhadores das mais diversas áreas para realizar alguma tarefa.

Alguns tipos de utensílios podem servir como armas, tais como o martelo e a faca, e algumas armas, tais como explosivos, usadas como ferramentas.
No reino animal também são usados dispositivos facilitadores de tarefas: a lontra do mar abre moluscos servindo-se dos mais diversos objetos, os macacos chegam a fabricar ferramentas rudimentares.
Em função do disposto acima, uma ferramenta pode ser definida como: um dispositivo que forneça uma vantagem mecânica ou mental para facilitar a realização de tarefas diversas.

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Quando tento explicar ou definir o que é UX — seja pra mim mesmo ou para outra pessoa— a melhor resposta que consegui encontrar até hoje é que UX é uma ferramenta.

Ao meu ver, a essência de uma ferramenta, em si, é neutra. Você pode usar a internet para pagar uma conta, comprar uma pssagem, ou para dar um golpe ou ofender alguém. A única diferença aqui é o uso que o sujeito faz da ferramenta.

Ou seja, você pode usar uma ferramenta para o “Bem” ou para o “Mal”: Polaridades .

UX do bem & UX do mal — uma questão ética e moral

Isso nos leva a uma questão muito discutida no mercado atualmente, uma questão filosófica, ética e moral: UX do Bem & UX do Mal. Este assunto, como diz minha mãe, “dá muito pano pra manga” — para manter o foco, irei abordar este assunto em outro artigo no futuro.

Ao meu ver, UX, como tudo na existência, é algo dual e polar: a experiência do usuário é Interna & Externa ao mesmo tempo — ela é objetiva e subjetiva.


UX e o 道 Tao

Depois de toda essa história, filosofando sobre a pergunta “O que é UX?” e sobre o Tao, cheguei a seguinte conclusão, mas gostaria de começar a resposta com outra pergunta:

O que é o Tao 道 ?
O Tao não pode ser expresso em uma palavra ou conceito, ele é indefinível, pois não cabe em uma palavra, além do que, a palavra não é a “coisa”.
O Tao é como o ar: permeia todas as coisas, mas não pode ser agarrado e nem visto por aí.
O Tao é o conhecimento intuitivo e prático da vida cotidiana, não é algo concreto ou palpável.
O Tao pode ser conhecido apenas através da experiência, e não através do conhecimento externo.

Releia a frase acima , mas troque a palavra “Tao” por “UX” e terá um vislumbre — na minha opinião — do que UX pode ser : )

UX está em tudo, mas não pode ser visto, muito menos definido em uma palavra, termo ou conceito.
UX é o que acontece no espaço existente entre nós e o mundo “real”.
UX é como o 道 Tao.


Gostaria de ressaltar que a ideia aqui nao é conectar UX a uma religião, mas sim, a algo que não pode ser expresso em palavras, algo que está além, algo que só se aprende com a experiência, e não através do conhecimento.

É dificil colocar as pensamentos e sensações em palavras. A Psicanálise lacaniana dá muita importância para essa questão, de como o sujeito tem dificuldade de colocar em palavras (linguagem) seus sentimentos, suas emoções, suas dores, sua narrativa, a história da sua vida.

“Você pode saber o que disse, mas nunca o que outro escutou.”
Jacques Lacan

O próprio Taoismo, assim como o Budismo, não é uma religião. Algumas pessoas ou organizações fizeram dele uma religião, mas ele em si é uma “coisa”, um framework de interpretação da realidade, da mesma forma que UX é um conjunto de frameworks que se conectam e trabalham juntos.

Além disso existe a questão da Polaridade, principal conceito do Taoismo e como ela se relaciona com o trabalho do UX designer, que pode projetar para o bem ou para o mal. Você pode projetar uma interface para que a pessoa compre uma passagem sem atritos e da forma mais simples possível, ou você pode projetar uma interface que vai influenciar o usuário a comprar primeiro o assento mais caro.

Pra encerrar, gostaria de citar a frase do autor existencialista Albert Camus:
“Não se pode criar a experiência,
é preciso passar por ela”

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( Caso saber um pouco mais sobre Lao Tzu e Taoismo recomendo a animação abaixo da School of Life, em inglês )

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