Um roadmap sobre a chegada dos carros robôs

[su_heading size=”26″ align=”left” margin=”0″]Será divertido, mais rápido e muito mais seguro. Também será menos poluente. Provavelmente elétrico ou solar. Os carros robôs tem tudo para serem inacreditáveis. [/su_heading]

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Por Bruno Tozzini – Associate Creative Director at SEÑORES

Mas antes, veremos os carros como conhecemos hoje morrerem de velhice. O atestado de óbito será complexo. Uma espécie de falência múltipla de um sistema que envolve comportamento humano, espaço físico, tecnologia, recursos naturais e até, mais filosoficamente falando, o próprio capitalismo trocando seu modelo atual por uma versão, digamos, quatro ponto zero. Vou tentar explorar um pouco as causas que levam a esta rua sem saída e algumas soluções que podem vir com quatro competidores da indústria de carros robôs.

Para a cidade, carro não é mais prioridade

De alguns anos pra cá ficou cada vez mais compreensível e visível o declínio dos carros. Seja como objeto de desejo, símbolo de status ou meio de transporte. As gerações mais novas simplesmente não se importam em ter um carro. Meu irmão caçula nunca comprou, nem ganhou, nem quer ter um. As gerações mais velhas não aguentam mais os custos de manter, muito menos trocar. As ruas e avenidas não comportam mais os ricos com seus SUVs e a classe média com seus sedans. Os estacionamentos não comportam mais ninguém. Quando comportam, são caros. Os governos passaram a adotar políticas que favorecem transportes eficientes, coletivos e sustentáveis. Seja em São Paulo, que tem muito a fazer, mas tem feito algo a favor das ciclovias e do Plano Diretor, que obriga investimentos em mobilidade, transporte coletivo e locomoção de pedestres. Seja em Paris, que vem proibindo a circulação de carros em diversos pontos da cidade. Seja em Londres e Nova Iorque, que há tempos são exemplos de cidades que funcionam bem com metrô e bike. A cada ano que passa, ter um carro deixa de ser regra e se torna exceção.

Dirigir é um prazer, quando é possível
Mas qual foi a última vez que você teve o prazer de dirigir? Acredito que em raras situações. Na maior parte do tempo você estava sozinho, como um robô, acelerando e freando em algum engarrafamento. Com sorte, aproveitando um bom aparelho de som, câmbio automático e ar condicionado. Com azar, indo para o mecânico, tomando uma multa ou lembrando que hoje é dia de rodízio.

Humano no volante, perigo constante

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Quando se trata de segurança, fique longe dos carros. O número de mortes causados por veículos guiados por seres humanos são assustadores. Sempre foram. Todos os dias milhares morrem em estradas e avenidas por besteira. Seja por falta de atenção, pressa, nenhuma prática (no Brasil qualquer pessoa consegue comprar uma carta de motorista) ou então por causa do álcool, sono e do aparelho celular. Não consigo imaginar nada mais lamentável do que morrer tirando uma selfie ou respondendo uma mensagem. Mas infelizmente, quando estamos no volante as decisões são mais emocionais do que racionais. Acabamos competindo por espaço, tempo e classe social.

O sonho acabou?

Nos jornais brasileiros vemos notícias sobre a queda nas vendas de veículos. Em Julho de 2015 a queda foi de 22,4%. Nos EUA dizem que tudo vai bem. Nas propagandas chega a ser engraçado o desespero de marcas que ainda tentam posicionar carro como “investimento”. Será que alguém cai nessa? O último que eu tive foi um ótimo investimento: perdi cerca de 30 mil reais. Isso sem contar os custos de manutenção e impostos deixados ao longo dos anos. Os anúncios de revista e jornal continuam nas mesmas fórmulas de sempre. Escolhemos AirBags opcionais torcendo para nunca ter que usar. A esta altura existem concessionárias que oferecem dinheiro vivo para quem realizar o sonho do carro zero. Pode procurar.

Quem iria dizer que uma das maiores industrias do mundo, que movimenta, emprega e gasta milhões, iria algum dia se deparar com um cenário desses. Se levarmos em conta tudo que gira em torno, fica difícil acreditar que o modelo atual possa ter um fim. Qual é o tamanho deste mercado que sustenta seguradoras, financiamentos bancários, lojas de autopeças, desmanches, petróleo e derivados? Gigante.

A ascensão do Big Four

E mesmo assim, talvez estes problemas e mudanças tragam novas soluções. Ou signifique o início do fim e a completa renovação do Big Three, nome dado ao trio GM, Ford e Fiat-Chrysler no EUA. E mesmo assim, pode estar aí a brecha para a ascensão do Big Four, formado por Google, Tesla, Apple e Uber. Todos de tecnologia.

Vou ficar com eles porque são os que estão mostrando trabalho adiantado no sentido de viabilizar a chegada dos primeiros carros robôs. E porque por trás estão nomes como Elon Musk e Sergey Brin. Caras que estão rodeados de inventores, investidores e capitalistas 4.0 que gostam de dinheiro e inovação na mesma quantidade. Aperte os cintos…

Google

Especialidade: Tecnologia e geolocalização

A começar pelo pioneiro na corrida dos Self-Driving Cars. O Google vem prototipando e testando há seis anos seus carros autônomos, que já rodaram quase dois milhões de milhas sem acidentes fatais. Todos acidentes ocorridos, até então, foram causados por terceiros. Seus carros robôs contam com uma série de sensores, lasers, câmeras, dados e sua tecnologia proprietária foi sondada por outros competidores, como a Tesla. Por ter mais experiência e tempo de pesquisa, o Google pode facilmente definir os padrões da industria no que diz respeito ao funcionamento de carros robôs — “hardware + software”.

Tesla

Especialidade: Energia

A empresa conhecida por carros elétricos mostra que também vai seguir o caminho dos carros robôs. O CEO Elon Musk acredita mais no conceito Auto-Pilot do que no Self-Driving proposto pelo Google. Um modelo onde o carro robô ainda será guiado quando necessário. Em termos de tecnologia embarcada e padrão de sistema, o Google tem mais experiência. Mas da Tesla podemos esperar uma peça que será decisiva para todos os outros: a melhor solução de energia para autonomia de carros robôs. Portanto, podemos esperar que os carros robôs elétricos logo virem solar.

Apple

Especialidade: Design e entretenimento

O projeto de carros elétricos da Apple, “Titan”, não é comentado de maneira oficial. Diferente do Google e Tesla que aproveitam suas iniciativas de inovação como marketing, a Apple só dará um parecer sobre o assunto quando tudo estiver a caminho. Dizem que estão recrutando profissionais da Ford e da Mercedes-Benz e teriam recrutado recentemente um VP da Fiat-Chrysler. Se a marca hoje é parceira de tecnologia e entretenimento de algumas grandes montadoras, faz sentido imaginarmos que eles irão oferecer as melhores ideias para o espaço interno de carros robôs. E claro, o design e os detalhes de um Apple Car podem superar todos os outros com facilidade. Mas no caso deles o desafio é o de sempre: bateria.

UBER

Especialidade: Serviços e geolocalização

O crescimento que o UBER teve nas grandes cidades do mundo é algo assustador a ponto de causar muitos protestos e greves. Enquanto o serviço cresce sem parar, dando dor de cabeça para políticos, taxistas e mudando o cotidiano de milhões de pessoas, a visão do CEO está lá na frente. Travis Kalanick trabalha para o dia em que a empresa irá viabilizar carros sem motorista. Para isso, o UBER, que hoje é avaliado em mais de 50 bilhões de dólares — sem ter carros próprios e sem motoristas como funcionários — montou uma base de pesquisa e desenvolvimento em Pittsburgh (EUA) para começar a testar os primeiros protótipos dos seus Driveless Cars. Em paralelo, seguem estabelecendo seu serviço em mais países, deixando o terreno pronto para viabilizar a provável segunda fase do negócio.

E aí, tudo começa a fazer sentido.

Por que não teremos um carro robô?
A ficha caiu quando o Google também começou a testar, em Israel, seus carros robôs usando um novo serviço de “carro compartilhado”, algo semelhante ao UBER, porém com o sistema do WAZE. Ou seja, UBER e WAZE querem compartilhar suas frotas de carros robôs, não vender.

Seguindo essa lógica, vejo alguns caminhos que fazem sentido para todos doBig Four. Sim, provavelmente os mais ricos irão comprar um Apple Car. Mas cruzando todos os argumentos que listei e fazendo ajustes em modelos de negócio que existem hoje, é mais provável surgir tantas opções de carros robôs a disposição, por preços acessíveis e modelos variados — tanto marca/modelo quanto o tipo de contratação — que para 99% das pessoas não faria sentido comprar e manter um.

Tudo sob demanda

O conceito “sharing economy” defende o acesso, não a posse de bens. Seja compartilhar carros, apartamentos ou bicicletas e assim ganhar algum dinheiro. Esse conceito/tendência com raízes democráticas e colaborativas, justificou o sucesso de vários serviços nos últimos anos, como o AirBnb. Mas a realidade não é bem essa na indústria que envolve automóveis e transporte. O Uber, por exemplo, nunca foi um serviço de compartilhamento de carros. E também nem tão inovador e democrático assim. A única coisa que compartilhou foi o acesso a sua plataforma e um padrão de serviços. Por sinal, muito bons. Dessa forma, o capitalismo 4.0 surge como uma adaptação de partes do discurso puro da economia de compartilhamento (democrático, colaborativo, inovador) para operar na economia sob demanda, aproveitando a seu favor fatores como a falta de regulamentação — e consequentemente poucos (ou zero) impostos — milhões de dólares em caixa e o apoio de milhões de usuários que se identificam com o discurso e pagam menos por um serviço melhor. O Uber é um bom exemplo, mas não o único. Acredito que esse modus operandi, ainda que controverso, será adotado por outros players.

Sem inventar nada, temos abaixo três caminhos parcialmente prontos

1/por hora

Você poderia alugar um carro robô por algumas horas, igual a serviços que existem hoje como o ZazCar em São Paulo, ZipCar em São Francisco e o E-Vai em Milão. Estas empresas oferecem carros normais ou elétricos que podem ser usados por hora. Basta escolher o modelo, reservar pelo celular e retirar em algum ponto da cidade. Sem contato humano, sem burocracia. Eu usei durante muito tempo o ZazCar em São Paulo e sempre foi uma boa experiência. Pretendo testar em breve o E-Vai aqui em Milão, mas por enquanto o metrô, trem e minha bike resolvem quase tudo.

2/por diárias ou finais de semana

Você poderia reservar um carro robô para uma viagem de final de semana ou para um dia na cidade, no modelo que hoje operam empresas comoUnidas, Hertz, Localiza, etc. Um único cadastro serviria para você usar carros robôs em qualquer lugar do mundo. Escolheu, reservou, usou. Você poderia escolher entre um modelo avançado e cheio de features da Apple para ir a praia ou um basico e barato da Tesla para um passeio no interior. Mas neste caso, estas empresas de aluguel teriam MUITOS ajustes a fazer em suas operações. O serviço tradicional de aluguel de carros ainda é lento e cheio de processos ultrapassados no mundo todo. O momento de retirada ainda é chato e leva tempo. Recriando a operação, tudo funcionaria bem.

3/por corrida

Com mais freqüência você precisaria chamar um carro robô do Uber ou Waze para cruzar a cidade, ir a uma festa com amigos ou resolver algo que sua bike e o metrô não ajudam naquele momento. Exatamente como é feito hoje com o próprio Uber ou 99taxi em São Paulo. Você pede pelo app, o carro te encontra e a corrida vem no cartão de crédito. Neste caso futuro, com o prazer de não ter que conversar sobre política/futebol e ainda poder colocar o som, cantar em voz alta e controlar o ar condicionado.

O mundo a partir de 2020

Resta saber quanto tempo vai levar para que isso tudo vire realidade. Ou eu estou delirando? Ok, pode levar algumas décadas. Durante este tempo vamos descobrir quem será o primeiro grande fabricante, o primeiro grande serviço e a primeira Detroit da nova era. Também descobriremos quais fabricantes de carros comuns irão conseguir evoluir a tempo de não perder a revolução.

Resta também saber quais serão as leis e regras que irão regulamentar a convivência entre carros robôs, transportes públicos e pedestres no momento em que os códigos de trânsito passarem a ser processados nas nuvens e redes V2V (vehicle-to-vehicle). Recentemente o investidor Reid Hoffman (LinkedIn, Facebook, PayPal) sugeriu que não estamos longe do dia em que será proibido dirigir carros comuns, a não ser em locais específicos para este fim. Afinal, dirigir não é um direito e sim uma licença.

Em relação a empregos, podemos imaginar muito mais embates do que vemos hoje, do tipo Uber x Taxistas. E eu vejo com otimismo estes embates, por mais difícil que seja enfrentá-los. A questão não é que carros e caminhões robôs irão tirar empregos de motoristas e caminhoneiros. E sim, estes deixarão de exercer atividades robóticas para (assim espero) poder exercer trabalhos melhores e mais humanos. Ser pago para dirigir um caminhão de lixo será algo impensável no futuro. Ser escravo de cartéis que vendem licenças para taxistas, também.

Isso tudo traz a esperança de um equilíbrio maior entre passado e futuro, resgatando cada vez mais o bom e velho “andar a pé”, aproveitando bicicletas, transportes públicos e quem sabe abandonando trabalhos robóticos e desumanos que envolvem veículos. E de quebra, com a possibilidade de se divertir dentro de carros robôs.

Alguns líderes do Big Four consideram a chegada dos primeiros modelos até 2020. Daí pra frente, não há mais volta.

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