Games e imersão

Acontece comigo o tempo todo e você com certeza já passou por essa experiência: não percebeu o tempo passar enquanto se divertia. Você, em um dado momento, estava realizando uma atividade que gosta ou estava se divertindo fazendo algo lúdico e não notou o tempo passar.

Simples assim. Você achou que estava há uma hora jogando seu game favorito e na verdade já havia se passado mais de três. Tinha certeza que estava navegando na web por duas horas e muito mais que isso já tinha corrido no relógio.

O tempo do entretenimento passa diferente do tempo real. Quando estamos envolvidos com uma atividade que nos entretém e nos mantém imersos é fácil perceber essa “mudança” no passar dos minutos. A nossa mente tergiversa por mundos diferentes e a sensação do tempo real se hibridiza com o tempo do entretenimento.

Poderíamos discutir esse fato com diferentes áreas do entretenimento ou mesmo com atividades que simplesmente possuem a capacidade de nos envolver e reter nossa atenção; porém, eu gostaria de usar o universo lúdico, mais especificamente a figura dos games nesta discussão, pois acredito que nos fornece excelente aporte para fazermos alguns bons apontamentos.

Já foi discutido amplamente em diversos estudos, pesquisas e livros o poder imersivo dos games. Não me refiro apenas aos games eletrônicos, mas aos games de uma maneira geral. Gosto de lembrar que uma partida de card game pode ser tão ou mais envolvente que um tiroteio multiplayer no first person shooter do momento.

Logo, um questionamento que pode ser proposto é: por que é possível entrarmos nesse estado de imersão dos games?

De uma maneira bem sintética podemos recorrer ao autor Karl Kapp (2012, p.69 e 70) que usa um exemplo elucidativo: quando você, por exemplo, joga “Uncharted 3: Drake’s Deception” no Playstation 3, você não fala para o personagem Nathan Drake atirar, você não o leva para os lugares do mapa e não dá comandos para ele seguir. Não! Na verdade, você não controla o personagem Nathan Drake porque você É o personagem enquanto está jogando o game. Ao operar Nathan Drake no ambiente do jogo, você aprende regras implícitas do mundo que está habitando naquele momento e isso é um dos fatores de imersão.

Essa citação de Kapp nos abre algumas portas para irmos mais a fundo dentro do conceito de imersão. Nesse caso, gosto de trazer para a discussão as ideias do psicólogo húngaro Mihaly Csikszentmihalyi (pronuncia-se Mihói Chick Sent Me High).

Csikszentmihalyi (1975) realizou estudos sobre um processo chamado “flow”, ou fluxo, traduzindo para o português. O psicólogo afirma que o fluxo é um estado mental no qual uma pessoa fica completamente imersa e focada no que está fazendo. Este estado exige total envolvimento mental e engajamento contínuo na atividade que está sendo realizada. Seria possível dizer que é um estado crescente ideal entre o tédio total e ansiedade/frustração, um momento de total absorção que oferece posteriormente um senso de satisfação.

flow

Segundo o psicólogo, no estado de fluxo o tempo não importa. Para pessoa engajada na atividade (que nesse caso pode ser o ato de jogar um game) pode aparentar que se passaram alguns minutos, mas na verdade podem ter sido horas.

O processo de fluxo necessariamente não é automático. No caso de um game eletrônico de Playstation pode demorar a se concretizar. O jogador pode precisar de tempo para aprender os comandos básicos, se adequar ao universo do jogo, estabelecer que recompensas simbólicas o jogo vai oferecer, etc.

Partindo disso, o processo de fluxo pode se iniciar cada vez que o player acessa aquele ambiente. A mente, literalmente, interfaceia com o universo do game e oferece a sensação de experimentar o tempo de uma maneira diferente.

Apesar de ser uma visão breve, nos direciona para alguns caminhos onde podemos aprofundar o assunto, principalmente no que diz respeito aos games.

E para finalizar, dedico este texto para todos os leitores e leitoras do UoD que precisam dormir cedo, mas falam para si mesmos “vou jogar só mais dez minutinhos”.


Referências bibliográficas

KAPP, Karl. The Gamification of learning and instruction: game-based methods and strategies for training and education. San Francisco: Pfeifer, 2012.

CSIKSZENTMIHALYI, Mihaly. Play and intrinsic rewards. Journal of Humanistic Psychology, Vol 15(3), 1975, 41-63. Clique aqui para ler.

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