Por que “This is America” é um clipe histórico?

Um homem negro tocando violão. Um homem negro tomando um tiro na cabeça. Cenários diferentes, com o mesmo indivíduo.

O novo clipe de Childish Gambino, stage name do ator, produtor e rapper Donald Glover, está dando o que falar por ser um belo de um tapa na cara. Mesmo que você curta o som, o flow, as danças, a letra, vai ficar com a pulga atrás da orelha no final. Como obra conjunta – clipe e música – “This is America” não é pra deixar ninguém feliz. É pra incomodar. Mesmo.

A começar pelo já citado homem negro morrendo com um tiro na cabeça no início do vídeo, seguido pela frase que intitula a canção: “this is america”. O cadáver do sujeito é arrastado e a arma do crime é repousada com cuidado sobre um pano vermelho. Isto é América!

E a chuva de tapas na cara não param por aí. O mesmo sujeito morto no crime volta no fim do vídeo. Afinal, as obras dos negros mortos estão aí e a gente precisa curtir um som, não é mesmo? E daí a amplitude do clipe vai além e chega no Brasil. Basta lembrar de grandes ídolos negros da cultura nacional que morreram na miséria ou por culpa da violência (vide Cartola e Sabotage). E estamos apenas nos primeiros segundos de vídeo!

Pra onde vai o nosso olho nesta complexa obra de Glover? Aliás, ele não está sem camisa à toa. O corpo negro é sempre motivo de debates. A hiperssexualização, seja do homem negro ou da mulher negra, é assunto recorrente.

Como mencionado no início, a música/clipe questionam, entre diversos temas, a postura que temos frente à arte do homem negro e o contexto em que ele vive. Afinal, enquanto Donald dança e faz caras e bocas da era Jim Crow, muita coisa acontece por trás. Não vemos porque ele dança muito bem ou não vemos porque optamos por isso?

E há mais mortes na obra. Um coral de igreja composto por negros é fuzilado. Isto é América! Uma clara referência ao massacre em uma igreja da comunidade negra de Charleston, ocorrido em 2015.

Segue o jogo, vemos Childish e seus passos – “I’m so fitted, I’m on Gucci, I’m so pretty” – enquanto é filmado por crianças com celulares. Uma das ferramentas mais poderosas utilizadas pelos negros para denunciar a violência policial (“That’s a tool”).

O caos segue, a dança também. Um cavalo branco passa em meio a dois carros: um de polícia e outro pegando fogo. Muitos confabulam que seja o cavalo branco do livro de Apocalipse, da bíblia cristã. “E vi o céu aberto, e eis um cavalo branco; e o que estava assentado sobre ele chama-se Fiel e Verdadeiro; e julga e peleja com justiça.”

Tudo se acalma quando Childish acende um baseado. As pessoas fogem, mas a dança continua sobre carros. A cantora SZA surge em mais um easter egg da obra.

Por fim, Donald aparece correndo de algumas pessoas. Mais uma cena com significados diversos. Afinal, a música parou, agora o cantor é apenas mais um. E, assim sendo, é perseguido. Seja lá qual for o motivo. Alguns até dizem que é uma referência ao filma “Corra”, já que o protagonista da obra, Daniel Kaluuya, fez a introdução de Childish ao público no último Saturday Night Live.

“This is America” ainda será muito comentado por aí. Basta ver no Youtube pra saber que surtiu o efeito desejado. E o timing de lançamento é perfeito. Afinal, Donald será uma das estrelas do próximo filme do universo Star Wars: Solo.

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