“A ausência de medo não é a coragem;
a ausência de medo é um problema mental.”
PO BRONSON
Steven Pressfield diz que o medo é uma força de resistência. Para ele, quanto mais medo sentimos sobre um empreendimento específico, mais certos podemos estar de que esse empreendimento é importante para nós e para o crescimento de nossa alma. “É por isso que sentimos muita resistência. Se isso não significasse nada para nós, não haveria resistência”, defende. O medo é bom, diz Pressfield. É um indicador. O medo nos diz o que temos que fazer: quanto mais assustados estamos com um trabalho ou chamado, mais seguros podemos estar por fazê-lo.
O medo nos faz pensar nos detalhes, tomar precauções e preparar o terreno para nos certificar de que o trabalho pode sempre ser melhor. O medo nos faz imaginar, e isso pode ser bom.
A maioria dos animais, como nós, sente medo…
A maneira como lidamos com o medo é uma construção cultural. Cada povo, cada cultura, cada tempo tem a sua própria versão de seus medos, receios e temores. A primeira exibição de cinema conhecida foi em 28 de dezembro de 1895, em Paris, sala Eden: Arrivée d’un train em gare à La Ciotat (Chegada de um trem à estação da Ciotat). Em pouco menos de 60 segundos, a primeira plateia acompanhou a chegada de um trem à estação. O evento foi tão insólito que várias pessoas simplesmente fugiram desesperadas para o fundo da sala com medo de serem atropeladas. Isso nos dá um exemplo simples de como o medo pode ser moldado. Ironicamente, hoje colocamos óculos 3D e de realidade virtual para sentirmos sensações ainda mais intensas, com os objetos ainda mais reais e vindo diretamente em nossa direção. O que foi aterrorizante um dia, agora é motor de uma indústria multimilionária.
A teoria de Pressfield sobre o medo é muito interessante. Confesso que quando a li em seu livro The War of Art – Break Through the Blocks and Win Your Inner Creative Battles – eu achei muito estranho. Afinal, passei boa parte da minha vida sentindo medo. Para dizer a verdade, quase a vida toda. Talvez não conte o período intrauterino. O medo, o receio, o temor, o pavor, a apreensão, a preocupação, a inquietação, a incerteza e a dúvida me serviram por tempos como companhias inseparáveis, mas quase sempre de forma negativa. Tirar proveito disso parecia ilógico. Me aproveitar de meus estimados e aterradores fantasmas soava estranho, e me dava ainda mais medo.
Eureca! Foi isso que me libertou. Se brigar com o medo também dá medo, então o medo é apenas uma ideia, e ideias podem ser alteradas, reconfiguradas. E conhecereis a verdade…
Um dos meus maiores medos era falar em público. E ainda continua sendo, tenho que ser sincero. Mas, o enfrentamento dessa situação está me ajudando a ser uma pessoa melhor, mais assertiva e positiva, além de muito mais criativa. Afinal, quando você aceita dar uma palestra precisa dar o seu melhor, já que pode ajudar outras pessoas a lidar com os seus próprios medos, e tirar vantagem disso. Hoje, consigo permitir que pessoas estranhas leiam o que escrevo; o medo está lá, de longe me olhando pelo canto do olho, é verdade. Mas, não dou muita bola pra ele. Sei que vai me pegar desprevenido, em algum momento, mas isso não me assusta mais, pois a própria vigilância e a possível falha vão me tornar mais consciente de minha missão como profissional, e como ser humano.
As máquinas estão assumindo postos de trabalho, há tempos na história do homem. Não é um fato novo. Desde que o homo sapiens se viu imerso no que Yuval Noah Harari chama de revolução cognitiva, experimentou um viciante drinque de imaginação, o qual lhe deu poderes, aparentemente, inimagináveis. A nossa capacidade de pensar sobre o que ainda não existe ou não é possível foi a ponte para dominarmos o mundo. Imaginamos tanto que o nosso dia a dia moderno é infestado de criações feitas para tornar nossas vidas melhores. Claro que isso é um fato questionável, mas temos que concordar que estamos o tempo todo imaginando coisas. Mas, com o tempo, o sapiens se perdeu e se permitiu pensar demais em algumas situações e de menos em outras. Identificar onde está o erro é o grande desafio do momento. Por isso criamos inteligências artificiais. Talvez porque pensamos demais e, talvez, tenhamos perdido o controle.
Seres humanos são criativos por que sentem medo. Medo da finitude, do desconhecido, do futuro e de si mesmos, pois não sabem do que são capazes, de suas possibilidades. Têm medo, pois têm a arma mais poderosa do universo: a capacidade de imaginar. E isso mudou a vida de todos os nossos antepassados, e não nos deixará na mão quando mais precisarmos dela. As máquinas inteligentes serão apenas mais um desafio, senão o maior, numa história que já provou que somos capazes de superar todos os desafios. Pelo menos até agora, já que o futuro sempre foi produto da nossa imaginação, até se tornar um presente inevitável.