Economia Circular: por que o audiovisual tem uma vocação natural para essa prática?

Um segmento de mercado cuja mão de obra é majoritariamente formada por freelancers, alocados por job para prestar serviços extremamente qualificados por tempo determinado.

Antes de a economia circular ser a bola da vez, o mercado audiovisual já a praticava. Se o cerne do modelo, quando aplicado a serviços, é a mão de obra autônoma em atividade e o mínimo investimento na aquisição de novos recursos e materiais, não é de hoje que nosso segmento é um adepto. 

Vamos aos fatos e conceitos para uma melhor contextualização. Embora o termo economia circular seja mais aplicado a produtos, com foco no máximo aproveitamento dos bens e consumo consciente de novos recursos para uma vida mais sustentável, vemos essa filosofia sendo aplicada também a serviços com a projeção de empresas como Uber e Airbnb. É preciso mesmo comprar um carro e colocar mais um automóvel em circulação na rua se há caminhos acessíveis para o transporte privado? Para que investir na aquisição ou construção de um imóvel se há boas casas e apartamentos totalmente equipados e disponíveis a custos bem interessantes para uma temporada?

Dessa perspectiva, o audiovisual segue esse jeito de ser e estar no mundo há bastante tempo. Trata-se de um segmento de mercado cuja mão de obra é majoritariamente formada por profissionais freelancers, alocados por job para prestar serviços extremamente qualificados por tempo determinado. O Mapeamento e Impacto Econômico do Setor Audiovisual no Brasil, um estudo publicado em 2016, realizado pela Associação Brasileira de Produção de Obras Audiovisuais (Apro), Sebrae e Fundação Dom Cabral, mostrou que para uma equipe fixa de 1 a 5 profissionais, uma produtora audiovisual independente tem entre 5 e 20 freelancers.

Outro aspecto que aproxima o mercado audiovisual da economia circular é a relação com os equipamentos. Já é costume do mercado alugar, em vez de comprar, o material para a realização dos trabalhos. Com a digitalização dos processos e a rápida adoção da tecnologia de ponta pelo setor, a produção de resíduos com filmes, rolos, arquivos, também foi superada e o audiovisual assumiu de vez a condição de indústria limpa.

Com a alta disponibilidade de freelancers extremamente qualificados no mercado, o fácil acesso aos equipamentos por meio das locadoras e a demanda crescente por serviços audiovisuais parece que há um perfeito equilíbrio para mantê-los ocupados e adequadamente remunerados. Uma cadeia produtiva em perfeita harmonia, certo?

Em tese, o cenário é lindo e responde bem a uma demanda represada de mercado. Na prática, funciona, mas com alguns entraves e pontos que precisam ser repensados para que esse modelo, que à primeira vista parece tão orgânico para o nosso setor, flua melhor e traga uma relação realmente ganha-ganha e sustentável, características indissociáveis da economia circular.

Uma das questões é a que diz respeito ao tratamento dado a esse profissional autônomo, fundamental para fazer a economia circular girar. Ainda é preciso fortalece-lo na relação com os demais agentes do mercado. Ele precisa ter condições decentes para a execução do trabalho, o que vai além do acesso aos equipamentos e mínima estrutura física. Ele precisa ser remunerado pelo tempo que se dedica, de fato, ao projeto. É bastante comum no mercado que um job que inicialmente tomaria cinco dias úteis consuma metade do mês do profissional. Resultado: muitas vezes por desajustes e falta de alinhamento de briefing e escopo de quem o contrata, ele fica com a agenda bloqueada para novas empreitadas e orçamento comprometido com o tempo extra empregado e não remunerado.

Idealmente, também, o freelancer precisa receber em no máximo 30 dias após a execução dos jobs. Sabemos que as mesas de compra de grandes empresas trabalham com prazos estendidos, de 120 dias ou mais, mas esse profissional não tem a estrutura e o caixa de uma empresa e suas contas vencem todos os meses.

Tem outro aspecto que, acredito, o próprio cenário de pandemia e pós-pandemia, marcados por recursos mais escassos, deve corrigir minimamente ou ao menos trazer algumas reflexões. É o seguinte: até que ponto haverá a valorização de grandes nomes e estruturas robustas de produção em detrimento de soluções mais ágeis, baratas e criativas? Com tanto talento disponível no mercado, é possível manter o fluxo de jobs para esses profissionais, mantê-los em atividade e ao mesmo tempo compor times enxutos, extremamente capacitados e alinhados à linguagem que o filme pede.

O digital está aí para aumentar exponencialmente a demanda por produção audiovisual por parte de empresas de diversos segmentos e portes. Oferecer soluções para uma entrega de qualidade independente do tamanho do projeto para que o cliente também possa movimentar seu negócio com agilidade depende de estruturas leves e moldáveis.

Tem um elemento que me fascina muito na economia circular que é tirar o foco do lucro e colocá-lo na prosperidade. Pensar e agir desse ponto de vista é, sim, um desafio diário, mas tem se revelado para mim cada vez mais potente e verdadeiramente transformador. 

Por Rino Siviero

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