Classe C: porque as marcas ainda têm medo?

Classe C é a maioria da população no país, mas as marcas ignoram sua existencia e relevância cultural

Muito tem se descutido sobre o futuro das marcas. Fórmulas milagrosas para vender mais, previsões de futuro, celebridades como head de inovação, metaverso, NFT. Além de pensar no futuro, aqui no presente ainda há dúvidas sobre como trazer representatividade para a prática, então, por quê ainda há dificuldade em compreendermos noções de classe e de que esse futuro é para poucos?

Vamos voltar e entender algumas coisas. Classe social é um termo usado para dar a ideia de que indivíduos e grupos são diferentes entre si e ocupam lugares diferentes na sociedade. Para o sociólogo Jessé de Souza, no Brasil há uma naturalização da desigualdade social e o abandono de uma classe inteira de indivíduos desprovidos de capital cultural e econômico.

Nesse contexto, meu trabalho tem a missão cotidiana de decodificar pessoas, culturas e comportamentos do presente, para desenhar possibilidades de futuro para as marcas. Começo trazendo uma nova visão do que é a classe C, que para além da renda, é uma lógica de pensamento e a construção de estilos de vida. É a classe trabalhadora de um país com 56% da população autodeclarada preta ou parda (importante dizer nem todas as pessoas pretas estão na classe C, mas diante da desigualdade exponencial que vivemos, a grande maioria das pessoas pretas hje pertencem às classes sociais mais baixas), de lares com mães solos e das juventudes periféricas.

Também, com as possibilidades que a internet trouxe, vimos novos ícones surgirem de lugares de escassez de recursos, mas abundância de cultura – Camila De Lucas, Kondzilla, Anitta, Juliette, Gil Do Vigor, Ludmilla, Mc Drica – personalidades que mesmo hoje, ocupando espaços sociais de privilégio, carregam os valores da classe C por onde chegam (a lógica da economia compartilhada, coletividade e impulsionar os seus).

Para muitas dessas pessoas, vencer na vida está diretamente relacionado ao aumento de crédito e consumo, afinal, vivemos em uma estrutura capitalista que renega suas existências. Para quem ainda pensa que este grupo se resume a consumidores de produtos baratos e sem qualidade, trago atualizações que podem mudar sua visão.

O consumo da classe C já foi maior do que o dos países Holanda e Suíça (Data Popular), o que gerou um maior desejo por melhores produtos, uma sofistição do consumo popular.

Agora, cabe a mim aqui, compartilhar alguns achados recorrentes – que obtive através de pesquisas realizadas na Eixo, ao lado de um time de mulheres incríveis que trabalham comigo – para marcas que não querem mais temer a Classe C, e sim buscam compreender os fenômenos culturais desse grupo.

Sofisticação do consumo: O paladar não retrocede, nem a predileção por desfrutar de coisas boas e de maior qualidade. E se agora, em período de crise, as pessoas se vêem desafiadas a consumir menos e melhor, hoje existem diversos canais que indicam como usar produtos, comprar artigos baratos que parecem caros, reforçando também a valorização da qualidade.

Fidelidade x Risco: É mais difícil a classe C mudar de marca, sim. Porém, isso não é fidelidade. Existe um risco de trocar de marca e não gostar, mas como os recursos são limitados, as escolhas têm que ser muito bem feitas.

Busca pelo melhor: Dentro da possibilidade existente, os grupos mais populares buscam sempre o melhor, principalmente no que tange aos valores relevantes para o grupo, como consumo doméstico, bebidas, educação, etc. A lógica do melhor está mais conectada ao bem coletivo.

Por isso, costumamos dizer que a classe C “se vira”, pois possui o poder do arranjo e a disposição para continuar consumindo o que conquistaram. O que precisamos ter em mente é:

1.Mercadorias fornecem muito mais que status. Um novo estilo de vida é comprado, mas para isso o produto precisa dialogar e imprimir importância individual e coletiva;

2.As marcas ganham uma nova dimensão e o consumidor acredita que possui o direito de consumir um produto/serviço de maior qualidade;

3.Assegurar que o consumidor não fez a escolha errada, pois estão associadas a qualidade e esse consumidor não pode errar na escolha do produto;

4.O consumo está ligado à dimensão hedonística: desejo constante de alcançar bem-estar e concretude do progresso.

Está evidente que nos últimos anos a maneira de consumir mudou, hoje gastar seu dinheiro é também um ato político e para quem tem o dinheiro curto, as decisões pesam mais. Por isso, é urgente relacionarmos construção e posicionamento de marcas à questões sociais e identitárias.

Existem muitos Brasis com diversas realidades, é a nossa missão conhecê-las. Que você se sinta provocado (a) a entrar nessa missão e assumir que equity de marca é uma métrica que não faz mais sentido num país tão plural quanto o nosso, e que a sua marca precisa da classe C.

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