Você riu do anão?

Coringa, um filme para destruir a forma como qualquer pessoa pensa sobre si mesma.

Você riu do anão? Então, vá procurar uma terapia. Sua situação é séria e você precisa de ajuda.

Sim, o filme de Todd Phillips é uma obra de arte. Chato demais ouvir as pessoas dizendo que a violência que ele mostra é desconfortável e perigosa. Perigoso é… bom, deixa pra lá. Todos sabemos o que é perigoso nessa nossa sociedade.

Assisti a cada minuto imerso em uma expectativa singular. Jamais estive em uma perspectiva tão avassaladora de entender a mente do ser humano. E não se engane, a loucura mais bizarra e estarrecedora não é a de Arthur, o personagem de Joaquim Phoenix.

O roteiro entrega de bandeja um Raio-X de nossas piores mazelas como seres humanos. A loucura está explícita e muito bem documentada em cada cena, revelando o que ela pode fazer com qualquer pessoa com um mínimo de sensibilidade.

O louco da história não é o Coringa, definitivamente.

Ele é o resultado de uma psicose social sistêmica. A sua condição é subestimada, renegada e esquecida, dando origem à sua desgraça épica. Ele cai de paraquedas naquilo que qualquer pessoa chamaria de puro acaso, e, no final, entende-se que uma sociedade que ama e defende doentes mentais como seus mártires é tão cruel, maniqueísta e pervertida quanto seus ídolos. Adoramos apenas aquilo que se parece com nossos próprios sonhos.

Se você riu na cena em que o anão sofre por temer por sua própria vida diante de uma porta que não se abre, você é tão doente quanto o personagem que temíamos ser capaz de tirar-lhe a vida.
O roteiro está o tempo inteiro tentando revelar o que há de mais sombrio em cada um de nós.
Arthur não é o vilão aqui. Ele serve apenas de catalisador em uma mistura química que contempla todas as nossas convicções como cidadãos de bem que pensamos ser. Afinal, esse meio social no qual acreditamos ser o lugar perfeito onde é possível viver nossos sonhos e aspirações pode ser o nosso próprio inferno.

Talvez você não consiga entender o que eu estou tentando dizer. Tudo bem. Mas tente, assim que puder, avaliar a realidade ao seu redor. Não vou dar dicas e nem mesmo fórmulas. Basta olhar com um pouquinho de paciência. Você acha, realmente, que está tudo bem e que a vida que você vive é a melhor versão possível do que esperava que fosse?

Temos inveja “mortal” de gente que tem coragem de se mostrar sem máscara; de gente que não tem mais paciência de fingir ser quem não mais conseguem ser. Suportamos apenas aqueles que ainda seguem suas vidas usando capas e maquiagens, capazes de mostrar apenas uma porção da sua própria essência.

O Coringa é apenas uma peça ficcional, não se engane. Violência há em todos os lugares e em tons e níveis muito piores e mais próximos que imaginamos. Mas, seria bom aproveitar para refletir sobre quem somos e o que queremos dessa nossa existência. Estamos enlouquecendo um pouco a cada dia, sem perceber que a beira do abismo está também cada vez mais próxima. Não há loucura no personagem de Arthur. Nenhuma que não tenha sido colocada lá, pelas mãos das pessoas que deveriam ter tomado conta dele. A falta de cuidado com nossas crianças, hoje, e o desprezo com o meio ambiente (não resisti) acarretará um preço impagável para um futuro muito próximo.
O filme é só uma obra de arte. Um chamado para que a nossa geração pense nos estragos terríveis que estão sendo feitos na mente das pessoas que um dia revidarão contra um mundo com o qual não se identificam.

Pessoas são fontes de surpresas doces e maravilhosas, mas também de tragédias que botam fogo em tudo e fazem a realidade se perder no horizonte. O preconceito é uma desgraça que apenas aumenta o poder destruidor de uma verdade inflamável que nunca tarda em mostrar a sua força.

Assista com o coração aberto, e não ria do anão. Se rir, procure ajuda terapêutica, rápido! Eu vou fazer isso, porque não resisti e ri alto, para minha fatídica tristeza….

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