Recentemente, apaixonada por inovação que sou, compartilhei com um amigo alguns links de notícias sobre a construção de um campus da Apple em Atlanta e os investimentos da Microsoft em um novo espaço na capital do estado da Geórgia, Estados Unidos. Se antes em meu discurso de elevador –elevator speech– gostava de destacar a cidade que agora estou vivendo por sua diversidade de raças e cores, música, ser sede de companhias como Coca-Cola e Delta Airlines, ter o aeroporto mais movimentado do mundo e ser um expoente de talentos com a Georgia Tech University, a vinda da Apple e a expansão Microsoft fez o meu discurso ganhar un segundos a mais.
No caso da Apple, a companhia está investindo em uma parceria com faculdades e universidades historicamente negras de Atlanta, para a construção de um hub global de inovação, com uma instalação que incluirá uma plataforma digital robusta para que os alunos se beneficiem desses recursos. A iniciativa é parte da promessa de U$100 milhões da Apple para ajudar a desmanchar as barreiras sistêmicas às oportunidades, oferecendo capacitação. O centro educacional será inaugurado no histórico Atlanta University Center ainda este ano.
Já a Microsoft está aumentando a sua presença na região, com um novo data center e a compra de um terreno de 90 acres para abrigar um futuro campus. A estimativa é que nos próximos meses, a região abrigue cerca de 2.500 funcionários. Segundo a empresa, os investimentos são significativos e colocam Atlanta no caminho de se tornar um dos maiores hubs da Microsoft nos Estados Unidos na próxima década, depois de Puget Sound (Seattle) e do Vale do Silício (Califórnia).
Mais recentemente, no fim de fevereiro, foi a vez da Airbnb, companhia que nasceu em São Francisco (CA), também anunciar a abertura de um escritório na cidade para empregar, segundo a empresa, ‘centenas de funcionários’, em cargos técnicos e não técnicos. Essa será mais uma das 17 instalações da companhia nos EUA.
Por razões estratégicas, quando uma companhia decide mudar, investir em um campus ou em uma instalação em um determinado centro urbano, geralmente leva em conta três fatores: talentos, infraestrutura e taxas de impostos. Isso se aplica a companhias de todos os setores, mas porque então as potências em tecnologia anunciaram sua chegada em Atlanta em 2021? A seguir listo alguns motivos:
Talentos
A América corporativa percebeu que para o bem de seus negócios, precisa se diversificar. Historicamente, o estado da Geórgia foi marcado pelo legado da guerra civil e Atlanta é a cidade onde Martin Luther King, um dos principais representantes pelo movimento pelos direitos civis, nasceu. E de fato, os negros têm muita representatividade por aqui. De acordo com o censo de 2019 dos Estados Unidos, a cidade tem 51% da população de negros ou afro-americanos, em segundo estão os brancos, com 40%. Ainda segundo um estudo de 2016 do Brookings Institute, quatro vezes mais negros trabalham no setor de tecnologia em Atlanta do que em San Francisco.
Seja para corrigir uma lacuna histórica no quesito oportunidades iguais para todos, vemos uma intenção das companhias em reparar essa falha não só oferecendo empregos, mas de fato investindo em educação e capacitação para que negros possam concorrer em posições igualitárias nos processos seletivos. A Apple, por exemplo, cita em seu mais recente relatório de diversidade que em 2019, 53% das novas contratações foram de pessoas que são parte dos grupos historicamente não representados nos EUA, incluindo negros e hispânicos.
A Microsoft por sua vez, reportou em outubro de 2020, que que os funcionários negros ou afro-americanos representam apenas 4,9% de força de trabalho nos Estados Unidos, ou seja, um espaço enorme para ser incrementado.
No caso da Airbnb, o anúncio da escolha foi seguido pelo discurso do Laphonza Butler, diretor de políticas públicas da empresa, explicando que a Airbnb quer aumentar as minorias sub-representadas para 20% de sua força de trabalho nos EUA até 2025, contra 12% atualmente. A companhia disse que vai trabalhar com HBCUs (Historically Black Universities) e incubadoras e programas existentes em Atlanta para solidificar o pipeline de oportunidades.
E já que o nível educacional é importante, Atlanta é abastecida com centros de excelência em educação como a Georgia Tech em engenharia e tecnologia, HBCUs e o Emory University. Para se ter uma ideia, cerca de 4.700 engenheiros se formam nas universidades da Geórgia a cada ano. Já o Emory Vaccine Center, é a maior empresa do mundo para exploração de vacinas baseada em universidade.
Entretanto, quando falamos de atração de talentos, deve-se levar em consideração a atmosfera que eles vão encontrar nesta cidade e aí vem um segundo estímulo.
Infraestrutura
Uma cidade amigável, com bom clima e custos de vida menores que os grandes centros. Além disso, Atlanta é uma opção mais barata na Costa Leste para empresas que precisam deslocar seus colaboradores constantemente para a Europa ou outras partes do mundo, em relação a Nova Iorque e Boston (sede do MIT) e de forma mais rápida que a Costa Oeste. Principalmente por ter um dos aeroportos mais movimentados do mundo.
Assim como Nova Iorque, Atlanta parece uma cidade em construção, mas ao invés de reparos em fachadas de edifícios, estamos vendo obras totalmente novas, literalmente saindo do chão. O que mostra que o mercado imobiliário está se preparando para uma alta demanda nos próximos anos.
Junto ao desenvolvimento da construção civil, cresce também o interesse pela arte urbana. É fácil encontrar painéis e murais pela cidade, muitos assinados pelo artista nova-iorquino Greg Mike, que atualmente está baseado em Atlanta com seu ABV Agency + Gallery, um estúdio criativo e centro para inovadores. Outras formas de expressão como a música com o hip-hop e o rap também ganharam muita notoriedade nos últimos anos e atraem diversos artistas.
Sem dúvida o florescimento cultural de uma cidade mostra quão progressista ela é, e foi uma das razões apontadas pela Airbnb em seu comunicado, destacando Atlanta como cidade com uma cultura criativa robusta e curiosa, atraindo uma grande comunidade de criadores.
Impostos
Com uma oferta de incentivos que vão desde crédito fiscal para estimular a criação de empregos e inclui uma série de outros créditos para investir em R & D (Research and Development), ou seja, pesquisa e desenvolvimento de produtos e inovações. Tendo criado um programa voltado ao tema, a Geórgia isenta os impostos sobre vendas e uso em uma ampla gama de investimentos que as empresas têm ao se acomodarem em um lugar ou renovarem suas instalações, incluindo compras de máquinas, ferramentas, moldes, matrizes, embalagens, energia e outros.
Para os centros de dados e empresas de alta tecnologia, o estado oferece opções para que estes se qualifiquem para vendas e usar isenções fiscais para algumas despesas que incluem equipamentos e computadores, geradores de backup de emergência, unidades de tratamento de ar, torres de resfriamento, armazenamento de energia ou tecnologia de eficiência energética, e muitos outros itens. Além de isenção total de impostos sobre vendas e uso de certos equipamentos de informática. Dá para perceber que tem todo um esforço e compromisso do governo local em receber essas empresas.
Seja pela diversidade ou pela combinação de todos os fatores, um novo ecossistema está sendo desenvolvido na região e as empresas de tecnologia sabem disso. A inovação não acontece por um acaso, ela prospera em um ambiente trabalhado e desenvolvido para isso.
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