Pessoas Trabalhando: uma entrevista sobre o projeto de troca de placas na construção civil

Parece simples, mas será?

Colorful branded banner reading "O que o release não mostra por Luli Liebert" in Portuguese against a white background.

Dois anos entre a ideia, o desenvolvimento e a execução. Este foi o prazo que o time da Publicis Brasil levou até colocar na rua, em conjunto com o Instituto Mulher em Construção, o projeto “Pessoas Trabalhando”, que se resume em trocar as placas da construção civil, aquelas que vemos em canteiros de obra, “Homens Trabalhando”, em valorização a uma força de trabalho que muitas vezes está ali, também com a mão na massa, mas são invisíveis ou submetidas “a fazerem a limpeza da obra”, as mulheres do setor.

“Pessoas Trabalhando”

uma nova placa para desconstruir estereótipos

Segundo Marília Freitas, PMO do Instituto Mulher em Construção, “a gente percebe pelas mulheres que a gente capacita que ainda é um ambiente mais hostil. Instruímos mulheres de baixa renda para serem auxiliares, que é a base ali, o primeiro cargo que têm. Depois que crescem, ainda é bem difícil, porque os homens também não estão acostumados com essa presença. O primeiro desafio é o preconceito.”

Segundo a executiva, cerca de 6.500 mulheres foram capacitadas ao longo de 18 anos e mais de 60 mil pessoas impactadas indiretamente.

A seguir, um resumo de uma entrevista coletiva que tive, via conference call, com representantes da agência e do instituto.

Entrevista

Yellow caution sign reading "PESSOAS TRABALHANDO" with blurred construction workers in background at urban worksite.

01. Update or Die: Como foi o processo criativo por trás da concepção do projeto “Pessoas Trabalhando” para substituir as placas de sinalização?

Luís Figueiredo, Diretor de Criação: As ideias mais legais costumam não surgir no ambiente de trabalho, na frente do computador. Elas surgem quando você está no banho, vendo TV, fazendo outras coisas, essa não foi diferente. A gente está aqui na Vila Olímpia, e quem está em São Paulo sabe que vive num canteiro de obra.

Estávamos andando e vimos uma obra, e uma mulher que estava colocando essas placas dos homens trabalhando, sabe? Ela, instalando a placa e fazia parte da obra – acho que nem ela se deu conta. Pesquisamos para saber se era uma exceção ou não, ter uma mulher aí no canteiro de obra que a gente sabe que é predominantemente masculino. E tem essa realidade, as mulheres já são mais de 10% da força de mão de obra na construção civil. Isso é muito poderoso e investigamos mais.

Fabio Astolpho, Diretor Executivo de Criação: Temos fóruns multidisciplinares e quando a ideia pintou dentro de uma reunião, com gente de áreas diferentes, falamos ‘opa, espera, aí tem coisa, né?’ As pessoas começaram a falar em participar e a coisa foi crescendo. No início do processo, a gente falou assim, mas como é que a gente faz para simplesmente fazer as pessoas trocarem uma placa? Porque é um trabalho muito diferente do que a gente faz em propaganda, para clientes convencionais.

Yellow caution sign on blue construction site fencing with text 'Atenção Pessoas Trabalhando' indicating 'Attention People Working' in Portuguese.

02. Update or Die: Quais foram os principais elementos considerados ao criar uma mensagem que fosse impactante e eficaz na promoção da mudança de mentalidade dentro da indústria da construção civil?

Luís Figueiredo: A gente estudou como é que a gente faria essa nova placa. Elas são diretas, não dão voltas. Será que a gente coloca ícone? Um QR code para ser escaneado? Paramos e falamos, a placa é um lugar de passagem, tem que ser simples, objetiva, leitura rápida. Simplificamos e chegamos no que são essas duas palavras – Pessoas Trabalhando – que passa a mensagem da forma mais rápida e objetiva possível, né?

Fabio Astolpho: E isso foi um baita aprendizado, para todo mundo aqui, porque a gente está acostumado a trabalhar com persuasão. Esse é um job de informação. Dentro de uma agência ou ainda mais para turma da criação, informar é o que menos as pessoas querem fazer. Então como fazer um troço desse ser legal? A hora que o projeto foi para rua, ele se mostrou extremamente suficiente, a gente mudar uma palavra, em vez de homens, pessoas.

Yellow and black caution sign reading 'ATENÇÃO PESSOAS TRABALHANDO' in front of construction materials on a job site.

03. Update or Die: Qual é o papel das agências de publicidade e comunicação na promoção de causas sociais e na mudança de comportamento em larga escala?

Fabio Astolpho: Não vou ser hipócrita, criativo gosta de ganhar prêmio, todo mundo sabe disso. A agência tem um dos pilares focado na diversidade, em promover igualdade. Nem só da agência, no Grupo Publicis. Todo mundo que entra aqui precisa aprender a exercer esse papel, desde a contratação, treinamento. Faz anos que tem o ENTRE, programa de formação de criativas periféricas. Existe um olhar dentro da agência para isso. Além disso, existe uma outra coisa que já faz anos que, se você é publicitário e não pensa assim, não sei o que está fazendo no ramo. A gente cria ideia todo dia para as nossas marcas. Se a gente consegue fazer isso, criar ideias para que as marcas vendam mais, gerem mais emprego e ainda por cima contribuam com um mundo mais igual, um mundo melhor, esse é o nosso ponto focal, né? Claro que é!

Man holding document aloft at event with attendees by a podium with safety awareness sign in the background
da esq pra dir: Rodrigo Alves (Secretário de Gestão de Salvador), Bruno Reis (Prefeito de Salvador) e Fernanda Lordelo (Secretária de Políticas para Mulheres, Infância e Juventude de Salvador).

04. Update or Die: Comentem sobre o envolvimento com o Instituto Mulher em Construção.

Tassiana Ferrari, Gerente de Negócios: Eu entrei no meio do caminho, quando já tinham feito essa ponte. São super parceiros, abriram muitas portas, os contatos com as construtoras, marcaram esses papos. Fomos visitar as obras graças à parceria do Instituto. Eles têm mais de 18 anos de atuação, capacitam essas mulheres, vão nas obras, dão palestras também para os homens, para de fato facilitar a entrada das mulheres no setor. É muito legal o trabalho deles e abriu o mundo de possibilidades para gente, nesse sentido de ampliar o projeto. Fomos ao zoológico no fim de semana e vimos a placa. Até o zoológico está pensando diferente, conseguimos ir além da construção civil. Também está sendo importante trabalhar esse outro lado da informação, do engajamento dos parceiros para o projeto.

05. Update or Die: Quais foram os principais desafios enfrentados durante a concepção e implementação do projeto?

Fabio Astolpho: Não ter o dinheiro de uma grande empresa por trás para mídia, para todo mundo ver. Então o one to one é importante, por exemplo, a gente tem uma outra pessoa de negócios que atendeu uma grande empresa de infraestrutura. Ela falou ‘pô, pessoal lá é meu amigo, vou passar o contato para vocês’. Aí, já mandou um WhatsApp para a galera e assim a coisa foi indo. Essa empresa de infraestrutura começou a usar, aí teve prefeitura que viu.

Luís Figueiredo: Achar a pessoa certa para conversar nas empresas, porque você liga, fala com o cara do comercial, ele diz não, é o cara no RH, que diz não é do marketing, mas o cara do marketing falou que isso é com a administração. E o curioso disso, é que normalmente a gente marca reuniões para explicar a ideia, que duram 15 minutos, o tempo para a pessoa se apaixonar por essa ideia.

Construction worker in hard hat holding "PESSOAS TRABALHANDO" caution sign at building site

06. Update or Die: Agora você foi chapa branca no final dessa resposta. Me fala um desafio?

Luís Figueiredo: Um desafio grande, que é você levar essa ideia para uma empresa e ela está se adequando aos poucos e questiona – será que eu coloco essa placa agora, mas será que eu tenho o número suficiente de mulheres? Será que eu tenho telhado de vidro? O interessante é que mesmo a empresa que decide por conta disso não colocar a placa, o fato de pensar a respeito do quadro de funcionários dela, é um ponto interessante sobre a ideia.

Tassiana Ferrari: Ouvimos muito nas reuniões que o mercado de trabalho está em falta de mão de obra. Então por que eles não abrem essa porta para as mulheres, sabe? A gente conversa muito com o instituto, elas falam, claro, precisa do esforço físico. Homem tem mais força. Só que mulher tem inúmeras qualidades diferentes, são mais organizadas, mais detalhistas, então tem lugar para todo mundo e de fato está na mão das empresas puxar essa fila.

07. Update or Die: De que maneira esse projeto se alinha aos valores da Publicis Brasil?

Fabio Astolpho: Tem os valores internos do grupo. Então isso faz bastante diferença e a gente tem um reflexo do que a gente vive aqui dentro. É uma agência que tem mais de 50% de mulheres, que tem uma grande maioria de liderança feminina, tanto na agência quanto no grupo. A gente vive essa realidade e isso acaba fazendo com que você chega na rua e tenha esse olhar curioso e questionador. Talvez, se a gente não vivesse isso no dia a dia da agência, não tivesse reparado.

Yellow caution sign on blue corrugated surface with Portuguese text 'Atenção Pessoas Trabalhando' meaning 'Attention People Working'

08. Update or Die: Existem lições aprendidas durante este projeto que vocês gostariam de compartilhar com outros profissionais?

Ricardo Sarno, Diretor de Criação Associado: O tempo de andamento de trabalho de agências é acelerado para as coisas acontecerem, mas os outros setores têm o seu tempo e a gente está respeitando muito o do setor de construção civil, onde uma obra é entregue em dois anos, coisas demoram 5 anos para acontecer. Em Salvador, conseguimos em menor prazo porque eu sabia dos projetos da Prefeitura de lá, porque eu sou de lá. Eu tenho conhecidos lá. Contei o projeto. Está alinhado com eles e fizeram acontecer em três dias, porque está dentro do que a Prefeitura está fazendo lá e aí, vai fazer com que em seis meses mude tudo, porque está no decreto então qualquer sinalização na cidade vai precisar ser mudada a partir de agora.

Fabio Astolpho: Hoje, um criativo, uma criativa não é mais só uma pessoa de redação, uma pessoa de direção de arte. Tem que ser 50% de direção de arte, 50% de redação, 50% de produção, 50% de tecnologia e 50% de design e estudar 250, 300% porque só sendo multi que a gente consegue estar conectado com a contemporaneidade, com que o mundo está vivendo e devolver isso em forma de trabalho. Este projeto nos ensinou muito a respeito disso na prática, porque teve criativo passando a mão no telefone e ligando para uma empresa que alguém deu uma dica. E assim foi com outras 25 pessoas da agência. Todas trabalharam não só dentro do seu quadrado e isso que faz uma grande diferença é para uma estrutura de uma agência hoje, que é ter gente que disposta a trabalhar não só para o job description.

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