SXSW: Filme brasileiro sobre o roubo da taça da Copa de 70 terá estreia mundial no festival

A seleção brasileira conquistou, com o tricampeonato na Copa do Mundo em 1970, a taça Jules Rimet. Em 1983, ela foi roubada da sede da CBF, no Rio de Janeiro. Supõe-se que o troféu tenha sido derretido mas, até hoje, o crime não foi completamente solucionado.

Essa história você provavelmente já conhece. A novidade aqui é que agora ela chegará aos cinemas por meio de um filme dirigido por Caíto Ortiz, roteirizado por Lusa Silvestre e produzido pela Prodigo Films.

“O Roubo da Taça”, que fechou distribuição internacional com a Picture Tree (o título internacional é “Jules & Dolores”), terá sua estreia mundial no SXSW, durante a mostra não-competitiva Visions, no dia 12 de março.

No elenco, Paulo Tiefenthaler, Tais Araújo, Danilo Grangheia, Milhem Cortaz e Stepan Nercessian são os principais nomes (Ah, tem o funkeiro Mr.Catra também).

Há poucos dias do festival, conversamos com o roteirista Lusa Silvestre sobre os desafios do roteiro do filme, as escolhas de abordagem dessa história e a expectativa da equipe para o SXSW.

O roubo da taça já foi explorado pela mídia e pelos meios de entretenimento. Qual foi a maneira escolhida por vocês para abordar essa história de um jeito diferente?

Existem três fontes, três ondas de informação sobre o Roubo da Taça. A primeira veio no calor do assunto: são as matérias de jornal que saíram na época do roubo, textos que tateamos tentando descobrir o que tinha acontecido. Dei muito espirro lendo recorte de jornal antigo. A segunda fonte é um pouco mais recente, veio na década de 90 com uma forte atuação da Revista Placar. Esta segunda onda é mais alicerçada, menos especulativa: houve tempo para se averiguar o que tinha acontecido; ela acontece com o peso da maturação do assunto. E já tinha gente presa. A terceira onda, na virada do século, lança mais luzes sobre o argentino que comprou a Taça dos ladrões – ele sim o maior bandido do grupo, bandido de verdade. Nenhuma dessas ondas de informação é conclusiva; nenhuma realmente esclarece o assunto. Aí eu fui passar uns dias no Rio, pesquisando, visitando o Santo Cristo, a Rua da Alfândega, o jornal O Dia, a antiga sede da CBF. Fui ver com os meus próprios olhos para, a partir dessa proximidade, reinventar um pouco a história. Demos a nossa visão, o jeito de contar diferente – que acredito ser a maior fortaleza da história. A história é quase toda verdadeira. Quase. Tem muita gente que sequer sabe que houve uma Jules Rimet, e que ela foi vergonhosamente roubada. A geração que hoje tem 25 anos não tem ideia do que aconteceu. Que elas descubram no cinema, com a gente.

Por que a decisão de seguir pelo viés da comédia?

Acho que não havia outro caminho. Basta olhar o que a vida nos trouxe de argumento: o cara está devendo dinheiro e resolve roubar justamente um dos maiores tesouros nacionais. Claro que ia dar merda. O cara que fez isso só podia ser sem-noção, e o filme mostra essa personalidade absolutamente ingênua e ao mesmo tempo divertidíssima. A história tem detalhes que obrigam a trama ser comédia. Por exemplo: a taça verdadeira estava exposta, com uma segurança ridícula. A réplica, de ouro, mas sem valor afetivo, era a que estava guardada no cofre.

Claro que estamos falando de um filme de roubo a banco – um gênero rico –, e que, portanto, pede também um viés de ação. Temos tiro, correria, tapa na cara, adrenalina, tudo. Uma das nossas inspirações mais presentes, no processo todo, foi Goodfellas, do Scorcese. Filme de máfia, de cassino. Então é comédia, mas tem ação, tem roleta, tem picareta tentando enganar o crupiê, tudo trazido para o Rio de Janeiro. Cassino carioca, clandestino, anos 80, delicioso – mas cassino.

Quais foram os desafios do roteiro?

Primeiro, teve a pesquisa, que eu pessoalmente adoro. Dá muita base para escrever. A história que a gente tinha como ponto de partida possibilitaria vários enredos diferentes. A gente foi experimentando, ia por ali, aí voltava atrás e recomeçava – como tem que ser com criação de cinema, de arte, de publicidade. Tivemos também a disciplina e a determinação para continuar escrevendo ao longo dos anos, mesmo quando o projeto dava passos para trás.

Outro desafio é o filme de época, coisa complicada sempre – mas que conseguimos lidar bem porque todos viveram intensamente a década de oitenta, e as referências ainda estão próximas. Ainda é fácil ainda achar um Genius da Estrela, por exemplo.

Outra dificuldade é a quantidade de personagens envolvidos na história. São quatro vilões diferentes – incluindo o policial. Se somar com o protagonista, que é o ladrão do filme, são cinco vilões. E tem também o par romântico. Lidar com tantos personagens relevantes é complicado, você tem que ser preciso para a história ficar coerente, inteligível, sem ficar um filme comprido e arrastado.

Por fim, ainda era uma história real. Há uma responsabilidade aí, inclusive jurídica. Demos muita sorte, porque o Roubo da Taça vem justamente num momento onde os podres do futebol mundial estão aparecendo. A história é super, hiper, mega, blaster atual mesmo tendo passado em 1983.

Qual a expectativa para o SXSW?

Cara, eu gostaria de estrear bonito. Com uma projeção bonita, o som saindo perfeitinho, as cores bem vistosas na tela, as pessoas gostando, comendo pipoca durante e tomando vinho depois. O filme estreia no sábado, dia 12, às 17h45 de Austin. Deve terminar às 19h45. Então minha expectativa maior é um zap zap mais ou menos às 23 horas daqui, vindo do pessoal da Pródigo que vai estar lá, dizendo que deu tudo certo. Ir bem em um evento badalado e charmoso como esse credencia a gente para estrear melhor aqui, quem sabe com mais salas.

No SXSW, o filme fará parte da mostra Visions, que exibe longas com ousadia de linguagem. Quais foram as ousadias de vocês?

Talvez a própria história seja essa ousadia, talvez o roteiro em si tenha seduzido tanto os curadores do SXSW – porque é um roubo que aconteceu mesmo, envolvendo futebol, vindo do Brasil, com a interpretação brasileira, os diálogos brasileiros, a fotografia brasileira, a trilha brasileira, somos brasileiros. Os gringos adoram essa originalidade nossa, ainda mais quando o roteiro é global. Nosso filme é um restaurante francês em Trancoso, se me entende.

Mas, na verdade, eu mesmo gostaria de saber qual é essa ousadia toda. O filme é muito bem pensado em tudo, mas não espere um longa fechado, hermético, esquisito, para poucos. É bem pop e inclusivo. É pra ir assistir no cinema de monte.

O que vocês esperam em relação à recepção do público com o filme?

Espero que agrade no SXSW e espero que agrade também em Duque de Caxias e Parelheiros. Espero que lá fora o filme ajude a manter o bom nome do nosso cinema. Espero que no Brasil as pessoas gostem do que fizemos, e avisem os amigos para que eles também possam gostar. Espero que a crítica em geral (há exceções) não seja como sempre, ingênua e parnasiana, e fale coisa com coisa.

O projeto especial do UoD, no SXSW, tem o apoio cultural do Santander, Twitter Brasil, Levi’s Brasil, Rede Atlântida (RBS), GoPro Brasil e Trip Editora.

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