Airbnb e o Branding Dona Florinda

O Airbnb demorou 12 anos para construir seu negócio, e quase perdeu tudo em semanas. Entenda porque você não deve romantizar demais o branding.

Começo explicando que o título pode ser meio dúbio.
Explico:
O Airbnb construiu uma marca forte de verdade.
Ele não fez o que eu aqui chamo de “Branding Dona Florinda” .

Foram estratégicos desde o começo, centrado nos clientes, procurando atender a uma necessidade ainda não suprida (de diferentes experiências de hospedagem para hóspedes, e de levantar uma grana extra para proprietários).
Meteram as caras.
Foram atrás.
Ousados.
Insistentes mesmo com a recusa de investidores no início.
E até colocaram um pouco o pé na lama.

Enfim, fizeram o que empresas de relevância precisam fazer:
Branding de um lado, para a marca ser apaixonante.
Estratégia de negócios de outro, para ela ser operante.

Hoje paira por aí um conceito geral sobre Branding em redes sociais, blogs e outros canais de pessoas apaixonadas por marcas que posso chamar de “Branding Dona Florinda” .

Um Branding que olha para suas marcas como “meu tesouro” .
E que basta chegar um “Professor Girafales” trazendo flores, já se derrete toda, convidando para tomar uma xícara de chá dentro de casa.

Deixa eu explicar melhor.

Primeiro: o “Professor Girafales” do Branding

Professor Girafales Wikipedia
Fonte: Wikipedia

Essa é a figura daqueles divulgadores de ações de marcas que chegam trazendo flores.
Não necessariamente professores (também eles), mas pessoas apaixonadas, cuja diversão é caçar cases e mais cases de grandes marcas que realizam malabarismos incríveis, tem insights geniais, se comunicam de maneira criativa e, com isso, vão sedimentando suas excelentes imagens no mercado.

Mostram a embalagem, a comunicação, o fato isolado. Seus olhos brilham. Trazem-nas como lindos buquês de flores e – quase sempre – esquecem que cada buquê presenteado, necessita de uma complexa estrutura de preparação de solo, luminosidade, irrigação, fertilizadores, isceticidas, modelo de negócio, precificação, estratégia de diferenciação, setor de vendas ativo, marketing, comunicação e, especialmente, pessoas dispostas a furar os dedos nos espinhos e cortar as flores do jardim.

O Branding Dona Florinda é um Branding que se derrete todo com as rosas, e que acredita que está nelas o grande diferencial das marcas.

Mas não.
Como uma andorinha sozinha não consegue fazer verão.
Nenhum buquê de rosas sozinho é capaz de fazer marcas sustentavelmente relevantes.
É necessário muito inteligência, timing, foco, suor, sagacidade, ousadia, tato, confiança, visão de negócios, lucratividade, estrutura de custo enxuta, estratégia comercial…

A lista seguiria todas as disciplinas de um MBA de Gestão de Negócios e mais um pouco.

Segundo: as marcas “meu tesouro”

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Aqui é que a coisa fica mais divertida.
E o Quico tenho a ver com isso?

As Donas Florindas do Branding (não estou sendo sexista, apenas circunscrevo a personagem dentro de seu contexto narrativo) são pessoas que enxergam suas marcas favoritas com o olhar de uma mãe apaixonada por sua cria. Altamente tendenciosa e positiva até demais.

Não importa se o filho jogou a bola na cara do Seu Madruga, o errado é o Seu Madruga.
Não importa se sujou o Chaves de farinha, o errado é o Chaves.
E nem o Professor Girafales em pessoa é capaz de fazer essa Dona Florinda enxergar a realidade do “seu tesouro”.

Não se misture com essa gentalha

É isso, em geral, que eu tenho percebido: uma rasa incursão ao Branding. Um foco gigantesco na ponta do iceberg, e pouca compreensão da profundidade necessária abaixo do mar. Uma desfiguração de seu papel central: o conector estratégico da essência da marca em todos os pontos de contato.

Eu costumo dizer que não sou apaixonado por Branding.
Mas que amo o Branding.
É diferente.
Paixão cega. Amor abre os olhos. Paixão é mera emoção. Amor é capaz de ver de maneira mais racional. Paixão coloca nossos pés nas nuvens. Amor consegue mantê-los no chão. Paixão é química. Amor é escolha diária apesar das circunstâncias.

Voltando ao Airbnb, em uma matéria recente na BBC o fundador Brian Chesky revelou: “Demoramos 12 anos para construir o negócio do Airbnb e perdemos quase tudo em questão de quatro a seis semanas”.

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O que dizer, então, aos cegamente apaixonados por Branding?
– Que a logo que mistura a inicial “A” com o formato de coração, pessoas e lugares não pôde salvar a companhia da crise do mercado.
– Que demitir 1,9 mil pessoas (25% de seus empregados) foi necessário e vital para manter o negócio rodando em esquema enxuto.
– Que o plano de abrir suas ações na bolsa terá que ser adiado, porque em 2019 especulavam um valuation de 42 bilhões, mas hoje não se sabe o futuro da companhia.
– Que a marca, para fazer a árdua escalada dos negócios, teve que meter o pé na lama, aplicando inclusive práticas anti-éticas de Growth Hacking. Não desmereço a atitude de maneira alguma, afinal é mais comum que você imagina que as grandes marcas de hoje souberam fazer seus macetes. É só abrir os olhos e ler um pouco mais.

Mas também…
– Na carta de demissão foram super humanos. Focado nas pessoas, generosos em seu cuidado e até mesmo deixaram claro questões de diversidade da equipe.
– A cultura organizacional é altamente respeitada e vivenciada de dentro para fora. Inclusive tema de publicações em artigos, para deixar todo mundo saber quem são por dentro.

Acredite no Branding, mas sem romantizar.

Acredite com olhos abertos. Acredite nele por completo. Não apaixone-se pela embalagem de nenhum perfume que soltam por aí, entenda mais, busque mais, aplique mais. Porque o Branding assim, no âmago das companhias, pode realmente fazer a diferença.

Talvez muitos diretores de empresa não topem realizar projetos de Branding exatamente porque falta aos profissionais essa visão dos bastidores, uma visão mais realista e que integre o negócio como um todo. Que consiga unir estratégia, marketing, posicionamento, agressividade comercial e resultados financeiros, a um projeto que engaje e apaixone equipes e clientes.

Conheço um caso exatamente assim, sem dizer nomes: uma pessoa conseguiu um almoço na agenda do – nada mais, nada menos – próprio CEO de uma grande marca de moda. Grande mesmo! História real! Nesse almoço teve uma hora inteira para explicar esse “tal de Branding”. Despediram-se e o CEO ficou de dar uma resposta. Logo depois o CEO ligou para o colega que esquematizou esse almoço e disse: “Cara, que viagem! Eu fiquei ouvindo por uma hora e não entendi foi nada! Descarta esse projeto aí que não tem nada o que nos agregar com resultados”.

Esse é o Branding Dona Florinda.
Apaixonado. Lindo. Meloso. Convidativo.
“Não aceita entrar para tomar uma xícara de chá?”

E digno de se apresentar em um programa de comédia infantil.

E você? Tem essa mesma impressão que eu?
Se tem, pode começar a quebrar o preconceito.
Branding é muito mais do que é dito por aí.
Cabe para empresas de pequeno porte.
É vivenciado na prática.
E alinhado com estratégia de negócios, traz sim muitos resultados.

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