Kevin Kelly no SXSW 2023: a inteligência artificial pode nos fazer humanos melhores?

Fundador da Wired é otimista sobre o uso da tecnologia, mas acredita que ela (e nós) ainda precisamos evoluir

Entre os discursos entusiasmados de mais de um lado e apocalípticos do outro, Kevin Kelly tem uma visão otimista sobre a evolução da inteligência artificial. Fundador da Wired e um dos maiores especialistas do mundo em tecnologia e inovação, ele foi um dos principais destaques até agora no SXSW 2023 com uma análise sólida e muito bem embasada sobre como ela já está impactando e continuará a impactar nossas vidas e nosso trabalho. E se vale o spoiler para tentar tranquilizar a leitura: calma. Parece que vai ficar tudo bem. :)

Kelly destacou que o ChatGPT já é a tecnologia adotada de forma mais rápida na história: de zero a 100 milhões de usuários em apenas duas semanas. Tudo isso porque as pessoas viram, em uma plataforma simples, a possibilidade de facilitar várias tarefas chatas e trabalhosas, como fazemos o tempo todo – e talvez nem percebamos mais.

“Há muitas coisas que achávamos que eram processos necessariamente humanos e descobrimos que, na verdade, são muito mecânicos – de jogar xadrez a reconhecer rostos ou analisar milhões de páginas de milhares de livros. Vivemos cercados de elementos mais ‘smarts’ que a gente para o que fazem, da calculadora ao GPS. Nossa inteligência, esperteza e QI dependem de milhares de elementos, cognições etc. E, com a IA, vamos poder resolver coisas em que somos piores que ela”, destacou.

Um ponto importante levantado por Kelly é que não há uma “entidade” inteligência artificial, mas várias IAs, cada uma com suas características e especificidades. “Já temos carros autônomos e sistemas que realizam diagnósticos mais precisos graças à inteligência artificial, mas ninguém quer seu carro praticando medicina”, brincou ao exemplificar.

Errar é (e continuará sendo) humano

Qualquer inteligência artificial, assim como quase qualquer criação humana, vem de milhões de tentativas e erros, além da evolução natural por conta da usabilidade, alheia ao seu “dono”. “Conversei com muitas pessoas que inventaram essas soluções e, basicamente, nenhuma delas sabia o que seria possível fazer com elas depois de ‘prontas’. Na prática, nós, os usuários, fomos descobrindo o que era possível fazer antes mesmo deles”, revelou.

O ponto central levantado por Kelly é que devemos repensar questões práticas e, principalmente, metas de produtividade. Afinal, se olharmos friamente, são atitudes antinaturais e até antievolutivas quando falamos da gente. Então, porque não deixarmos a máquina fazer o trabalho sujo e nos permitirmos fazer o que fazemos de melhor como humanos: errar?

“Uma das coisas que sabemos é que a IA faz coisas que os humanos não querem perder tempo fazendo. Sempre, na história, usamos máquinas para potencializar produtividade. Até porque, ela é uma ótima métrica para máquinas e terrível para os humanos”, enfatizou. “A ciência em si é ineficiência. Você tem que errar muito até ter êxito. Com a arte é a mesma coisa. Ou seja: o que a gente mais gosta como humanos são processos naturalmente ineficientes”, provocou.


Ocupando espaços vazios

Kelly lembra que estamos naquele momento especial e excitante onde vamos descobrindo novas possibilidades para o uso de uma nova tecnologia. Afinal, como ele bem lembrou, “uma tecnologia só pode ser considerada um sucesso quando se transforma em invisível, independentemente da interface. E isso já está acontecendo, e vai continuar a acontecer, com a inteligência artificial”.

Sobre sua aplicação no dia a dia, sobretudo em funções profissionais, o fundador da Wired tentou acalmar os alarmistas que acreditam no fim dos empregos – ou até dos artistas – com o uso de padrões e criações instantâneas. Inclusive trazendo um dado interessante de evolução de entrega para diferentes especialistas. Segundo ele, programadores já são 56% mais produtivos e escritores 37% mais ágeis em suas tarefas ao realizá-las com o apoio da IA.

“Na maioria das vezes, a inteligência artificial não está substituindo pessoas, mas sim ocupando espaços vazios”, analisou. Reforçando que não conhece ninguém que tenha perdido o emprego, até hoje, por causa da IA, ele deixa como claro recado que, o mais importante, será aprender a usá-la da melhor e mais amigável forma para o que você tem que fazer. “Acho que, em breve, seremos pagos pelo que podemos e conseguimos fazer com as ferramentas oferecidas pela inteligência artificial”, complementou.


Humanos melhores

Kelly é otimista sobre o novo mundo que vem se construindo graças às possibilidades trazidas pela inteligência artificial. Porém, lembra que ela vem de nós e, por isso, ainda é falha – o que é inadmissível, tratando-se de um projeto que nasce com a exatidão como meta. E nessa busca pela evolução, quem sabe, como ele acredita, a gente não evolui junto?

“A IA é treinada e imperfeita como humanos, muitas vezes racista, sexista, porque é baseada no que a gente é. Mas a gente não pode aceitar que elas sejam assim. Ou seja: ela terá que ser melhor que nós somos”, ilustrou. “Esse processo vai causar uma crise de identidade em nós mesmos: quem somos, o que queremos ser e o que ‘melhor que nós’ significa? Talvez o objetivo final da inteligência artificial seja usá-la para que nós mesmos nos tornemos humanos melhores”.

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