A necessidade do inexplicável no storytelling virtual imersivo

Os paralelos entre modelos sociais e a construção de ambientes virtuais imersivos.

Não sou particularmente um homem religioso; na verdade, a ideia da aleatoriedade e da padronização casual me soam muito mais interessantes e empolgantes que uma visão maktub ou de regulação autocrática de mundo.

Isto, porém, não me impede de referenciar o conceito de deus; não representado como um ser mítico onipresente, onisciente e onipotente, mas sim como a infindável ignorância sobre o que nos cerca, o ilustre desconhecimento sobre o funcionamento de muitos aspectos do (nosso) universo.

De todas formas, o objetivo deste texto não é o questionamento individual do que se aceita como verdadeiro, mas traçar os paralelos entre estes modelos sociais e a construção de ambientes virtuais imersivos.

 

“De onde veio isso?!”

Em um ambiente virtual imersivo coletivo (mundo virtual, game multiplayer, etc), mais do que aceitar a intervenção “divina”, os seres que ali habitam parecem de fato necessitar de acontecimentos de origem desconhecida para se sentirem motivados a continuar existindo (naquele ambiente).

Fugindo das discussões filosóficas, a existência do inexplicável parece ser fundamental para nossa aceitação de realidade, afinal, desde as primeiras consciências humanas, evoluímos nosso conhecimento na busca por respostas àquilo que não sabemos explicar em uma corrida infinita que extrapola a existência individual, mas determina novos horizontes para a espécie humana. Na vida real, Thor e Chac dão lugar às descargas elétricas; Rá e Mitra perdem seus tronos para a fusão nuclear; em um constante preenchimento do deus das lacunas de Henry Drummond.

 

Talvez precisemos do inesperado

vr_surprise

Mesmo em simuladores (metaversos), há maior envolvimento quando situações externas romperem com o controle do usuário. Caso contrário, a onipotência sobre os resultados de todas as ações tornarão a vivência neste ambiente demasiada entediante. A surpresa e o mistério são importantes para periodicamente ativar os mecanismos de atenção do cérebro e, assim, manter a consciência imersa no ambiente virtual.

 

Talvez precisemos de inimigos

The VOID
The Vision of Infinite Dimensions (The VOID); mundos virtuais construídos sobre espaços físicos

Como máquinas de sobrevivência, a utilização do antagonismo como elemento de motivação é bastante simplório, embora efetivo. Afinal, garantir a própria perpetuação ou posição dominante, ainda que em ambientes virtuais, segue sendo uma considerável força motriz.

 

Mas, sim, precisamos do inexplicável

A aceitação de uma realidade alternativa, porém, extrapola as surpresas e antagonismos. É necessário sucumbir ao místico, ao sobrenatural, que, longe das interpretações espirituais, são representados pela ausência da compreensão.

Ocorrências, ainda que negativas, cujo ponto de origem não pode ser explicado motivam estes indivíduos no ambiente virtual imersivo a responderem exatamente como o fazemos em nosso mundo “real”: buscar entender de onde aquilo veio (foco no passado), procurar resolver o problema causado por este evento desconhecido (foco no futuro) ou a submissão frente àquela força, muito maior que ele(s), e a consequente aceitação de ordens.

Em outros casos, porém, a simples existência de uma força maior que altera o entorno já basta para aumentar a credibilidade daquele universo. Como um exemplo extremamente simples, esta é a razão pela qual diversos desenvolvedores de jogos preocupam-se com a retratação fidedigna do clima em seus ambientes; é o apelo ao mais antigo modelo divino, a falta de controle sobre a natureza, o chamamento a Zeus, à Tlaloc, à Tsui, à Oxumarê, ou, chuva.

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Se o sentido da vida é termos problemas, em um ambiente virtual imersivo eles são melhores aceitos quando criados por uma entidade intangível, inexplicável.. chamemos de ‘destino’, ‘deus’, ‘maktub’, ‘administrador’, ‘grande arquiteto’, ‘mestre das trevas’ ou qualquer nomenclatura que identifique o ilustre, necessário e temido: inexplicável.

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