Ettore Scola. Feio, sujo e genial.

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Post por Aaron Sutton. Redator publicitário , palmeirense, estudante de gaita blues e um eterno arrependido por não ter nascido na Itália.

Escrevo este artigo do alto da minha arrogância enquanto macaca de auditório do cineasta Ettore Scola, que faleceu esta semana. A ideia, portanto, é apenas destilar aos leitores do UoD um pouco da minha babação de ovo sem absolutamente nenhuma pretensão intelectual.

Fellini era “Felliniano”. Chaplin era “Chapliniano”. Hitchocock era “Hitckcokniano”.

Irmãos Cohen, Wes Anderson, Woody Allen, Tarantino, Kubrick. É fácil reconhecer as marcas do cinema.

Acontece que Ettore nunca foi “Ettoriano”.

O que, para os críticos de cinema de jornal é um problema, para os fãs é uma delícia.
Cada Ettore Scola é UM Ettore Scola.

Pegue por exemplo três filmes: “Feios, Sujos e Malvados”, “O Baile” e “A Família”.

Se um E.T. baixasse hoje em uma sessão póstuma da Mostra de Cinema jamais imaginaria que eles foram dirigidos pela mesma pessoa.

Nem mesmo imaginaria tratar-se de um cineasta italiano. “O Baile” é tão francês quanto os filmes de Jaques Tatit.

“Feios, Sujos e Malvados” é a opera dos errados. Italiano até o último fio de espaguete, mas ao mesmo tempo um filme que poderia ter sido rodado numa favela do Brasil ou da India.

Ettore Scola era declaradamente um cineasta “de esquerda”, mas o filme supracitado não tem nenhuma politização da pobreza. Scola não glorifica nem intelectualiza.

A pobreza dos feios é a pobreza como ela é. Suja, engraçada, caótica, italiana.

Se você nao assistiu “O Baile”, nao acredite no wikipedia que tenta definí-lo como um filme sem diálogos que conta a história da França através da dança e da música. O filme é uma playlist com o melhor que a música do século 20 produziu. Um viral de duas horas com a evolução da dança. É uma aula de história. Uma história em quadrinhos sem diálogos.

Confesso que estou longe de ter assistido a todos os filmes de Scola, mas de todos que assisti, o meu preferido é “A Familia”. No dia em que vi, saí do cinema com vontade de entrar no primeiro vôo da Air France e pedir a Fanny Ardant em casamento.

Se você algum dia você se perguntou como um detalhe, uma bobagem, uma resposta errada, um não em vez de um sim, uma indecisão besta, uma titubeada, uma vírgula mal colocada mudou pra sempre o rumo da sua vida, então obrigue-se a assistir a esse filme. Se abstrair por um momento, vai ver na história de Vitorio Gassman e Fanny Ardant um pouco de Truffaut, um pouco de Bergman, um pouco de Woody Allen, um pouco de Frank Capra, ou seja: meio francês, meio sueco, meio judeu, meia aliche, meia mussarela.

Sei que no começo deste texto tentei convencê-los que Ettore não tinha estilo nem padrão, mas de algum modo, mesmo que pequena, existe intersecções em seus filmes por mais diferentes que sejam.

Se eu pudesse resumir numa frase, diria que Ettore Scola filmou o errado. Pessoas erradas, decisões erradas, histórias erradas.

Ettore Scola nos mostrou a beleza e a poesia do erro.

E hoje, em um mundo em que o que vale é a foto certa do perfil do Instagram, a frase certa do Twitter e a posição politicamente correta e chata do Facebook, nunca foi tão importante relembrar a genialidade de um cara como Ettore Scola.

Já está fazendo falta.

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