Kiss my Brand

Na interseção entre música e negócios globais, como uma banda icônica de rock, com mais de 50 anos de carreira, reafirma seu valor no mercado ao vender sua marca e ativos por impressionantes 300 milhões de dólares

Conhecido por suas performances explosivas e maquiagem icônica, o Kiss não só produziu inúmeros hits, mas também se projetou com uma abordagem de branding extremamente eficaz. A recente venda de sua marca à sueca Pophouse Entertainment por uma quantia extraordinária sublinha igualmente a influência duradoura da banda e seu sucesso contínuo que transcendeu crises da indústria musical, mantendo sua relevância ao longo das décadas.

Além de uma simples transação comercial, a aliança com a Pophouse representa uma estratégia pensada para manter o Kiss na vanguarda do entretenimento. Com o término anunciado de futuras apresentações ao vivo na ‘End of the Road World Tour’, encerrada no final de 2023, a banda busca transformar sua música e marca em experiências que transcendem o tangível, explorando os espaços digitais e virtuais. Este movimento ecoa o sucesso do projeto Abba Voyage da Pophouse, que integrou shows virtuais com a presença de músicos reais e avatares digitais no mesmo palco, provando o potencial lucrativo do formato incomum.

Nada de novo para uma marca acostumada a inovar e antecipar tendências de branding e marketing como o Kiss; uma aderência construída com competência ao longo de décadas — para quem não está acostumado com jargões de marketing, deixo a explicação para o ChatGPT:

“‘Aderência’ refere-se à capacidade de uma marca de capturar e manter a atenção e o interesse do público. Isso envolve criar uma impressão memorável e significativa que fortalece o engajamento e a fidelidade do consumidor, garantindo que a marca permaneça preferida e relevante ao longo do tempo.”

Mas como o Kiss conseguiu navegar por tantas gerações, por tanto tempo, e continuar a ser relevante ainda hoje? Nos anos 70 e 80, havia bandas que compartilhavam, em maior ou menor grau, a mesma audiência e, digamos, com muito mais talento musical, mas que apesar do sucesso não tiveram a mesma longevidade ou projeção pop do Kiss, como Alice Cooper, T. Rex e New York Dolls. E bandas com alto impacto cênico como Mötley Crüe, Twisted Sister e Judas Priest. Antes que alguém mande o Eddie puxar meu pé à noite, confesso que Iron Maiden é quase uma exceção, mas mesmo assim, eles parecem não querer prolongar seu legado de maneira tão marcante.

A genialidade do Kiss transcende sua música; eles sempre souberam como posicionar sua marca antecipando tendências e evoluindo junto com seu público. Foram pioneiros em vídeoclipes, tornaram-se personagens de séries de quadrinhos, estrelaram seu próprio filme e até protagonizaram um especial de Natal na NBC. 

Essas ações não só consolidaram o Kiss como uma marca inovadora, mas também fortaleceram laços emocionais com seus fãs, a ponto de várias equipes de futebol americano em escolas secundárias adotarem o Kiss como seu mascote. Inventaram o marketing de guerrilha, antes de ser definido assim por Jay Conrad Levinson, ao se apresentarem num baile de formatura do ensino médio. Tudo isso ainda nos anos 70. Desculpe aí, Maroon 5.

Nos anos 80, na ausência da internet, o Kiss criou um dos maiores cases de marketing de antecipação ao anunciar o fim das apresentações com a icônica maquiagem facial e finalmente mostrar a cara quase lavada de seus integrantes ao mundo — confesso que prefiro Gene Simmons, a segunda língua mais famosa do rock, de cara pintada. Avançando para os anos 90, a banda foi pioneira na distribuição de suas músicas através de canais digitais, explorando territórios então novos para a indústria musical e por aí vai.

De action figures a lancheiras, de preservativos ao controverso Kiss Kasket, a banda criou uma conexão profundamente pessoal com seus fãs, transformando o consumismo em atos de fandom no mais puro estilo Brand Evangelism. Particularmente, o Kiss Kasket, ou Caixão Kiss, é um exemplo visionário de marketing de provocação, técnica que antecedeu, e talvez tenha inspirado, o buzz marketing de marcas como a Balenciaga e seus produtos criados para serem comentados, não comercializados, como a Ikea Tote Bag, o Paris Sneaker Full Destroyed e o bracelete que imita um rolo de fita adesiva, todos a preços exorbitantes; estratégia projetada para gerar ressonância orgânica em mídias sociais, mostrando que o Kiss entendeu cedo, antes da world wide web, o poder do marketing viral. Como gosto de lembrar, se você pensa que viu algo novo, provavelmente só está mal informado.

E quantas marcas você conhece, com menos de cinquenta anos, que exibem essa vitalidade? E vinte e cinco? E cinco? A resiliência do Kiss no mundo do entretenimento, demonstrada por um gerenciamento de marca que prioriza evolução e movimentos constantes, tem muito a nos ensinar — uma lição valiosa de aproximadamente um bilhão e meio de reais.

P.S.: E pensar que a icônica maquiagem do Kiss, uma das assinaturas visuais mais marcantes já adotadas por uma banda, tem suas raízes no Brasil com o Secos & Molhados. Mas se essa história é nova para você, aqui vai uma citação de Gilberto Gil: ‘Procure saber!’.

por Giuliano Cesar 

Diretor criativo, diretor de arte e designer, apaixonado pela convergência entre publicidade, design e tecnologia como ferramentas estratégicas de comunicação. Com mais de 25 anos de experiência na construção e no reposicionamento de marcas, produtos e serviços em agências como DM9, Africa e DPZ, atualmente é sócio-fundador da NOV’Brand, um estúdio de branding, design e criação atendendo clientes no Brasil, EUA e Itália.

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