O amor nos tempos do Instagram

Na cultura digital, a percepção do tempo mudou. Somos medidos pela quantidade de cliques e onde os colocamos.

Não vou negar, me sinto um pouco mal quando navego pelo Instagram. A razão? Bom, muitas. Talvez não me faça bem assistir a felicidade alheia. Talvez seja incômodo perceber que as outras pessoas viajam mais, amam mais, brincam e se divertem mais, enfim, vivem melhor e mais intensamente que eu. Mesmo que isso talvez não seja a verdadeira versão de realidade.

Quando li o texto “O mundo globalizado e tecnológico está matando os clássicos”, do meu novo amigo Henrique Szklo, comecei a imaginar as ideias que ele havia exposto nas linhas que escreveu. A esquizofrenia que mantém nossos dedos deslizando telas luminosas, em busca de alívio emocional está impregnando nossa vida e a nossa capacidade de conviver. Engraçado Szklo dizer que “O amor nos tempos do Instagram são assim: lânguidos”. Quando menciona uma série de criações épicas, icônicas e memoráveis como “Take on me” do A-ha, “This is America” do Gambino, “Thriller” do Michael Jackson, Game of Thrones, Walking Dead e La Casa de Papel, mostra como cada uma delas é dependente de como a cultura do momento pode torná-las eternas ou apenas um amor de verão.

Eu mesmo adoro vasculhar a Internet em busca de “pérolas” dos meus tempos de moleque. É uma forma de voltar no tempo e me sentir reconectado àquele tempo. Um jeito artificial de voltar a ser jovem. Talvez esse seja o segredo de um clássico: um portal que nos leva a lugares de onde não gostaríamos de ter saído. A música, o cinema, as artes, a literatura, etc., e todas elas misturadas são uma busca humana de nos agarrar a um presente que inexoravelmente nos abandona. Impiedoso, nos permite apenas lembrar ou gravar artificialmente o momento imediato.

Na cultura digital, a percepção do tempo mudou. Somos medidos pela quantidade de cliques e onde os colocamos.

Os memes atuais, versões modernas dos clássicos, são um jeito de escrever nossa história com frases curtas. “Será que precisamos guardar em nosso arcabouço emocional ideias e coisas que nos façam retornar no tempo e reviver nosso passado?”, argumenta Szklo. No futuro, será que não precisaremos de um passado maior do que quinze dias? Pergunto eu. Talvez, com o volume imenso de informações que teremos que lidar, tenhamos que limitar o alcance de nossas lembranças, dependendo de aplicativos para nos lembrar do que comemos no café da manhã de ontem ou os amigos com quem conviemos.

Para Szklo, talvez a falta de ideias em estado sólido será, na verdade, um avanço em nossa evolução como espécie. Ele imagina e se pergunta se isso nos fará finalmente capazes de viver apenas o momento, “já que o futuro também será tão cheio de expectativas que para a nossa própria sanidade mental e emocional tenhamos de nos fixar apenas no presente absoluto”. Difícil responder a essas questões, mas uma coisa é certa: vamos continuar pensando, imaginando e querendo novidades, mesmo que sejam versões repetidas do que já tenha nos encantado um dia. Ora, isso talvez seja a receita de um clássico. Ou estou errado?

Enfim, a boa notícia é que teremos onde guardar nossas memórias; seja como Ray Kurzweil imaginou, fazendo upload de nossas mentes, ou seja algo totalmente diferente, não importa. Uma cópia de nossas experiências estará disponível em algum lugar. A forma como lidamos com isso é que muda, com o tempo. Sentimos saudades de formas diferentes, falta de coisas diferentes, raiva e amor de maneiras que nunca são as mesmas e nem mesmo os motivos. O mundo está mudando e não sei se poderemos resolver os problemas que surgem apenas dando um like.

O futuro parece ser digital, mas ainda estamos presos em corpos biológicos, sedentos por emoções, o máximo que pudermos experimentar; mas sem um mapa confiável de onde encontrá-las. Enquanto isso, continuamos a contar histórias, mesmo que durem apenas uma ínfima fração do tempo de um clássico “clássico”, pelo simples fato de que sem elas não seríamos quem somos: viciados naquilo que somos capazes de criar.

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