O ex-educador do futuro

O quanto a educação terá de evoluir para não perder o bonde do futuro?

De acordo com o dicionário Oxford o verbo “evoluir” quer dizer “passar por processo gradual de evolução ou transformação; evolver, evolucionar”, além de “executar evoluções, movimentos, deslocamentos graduais e harmônicos”.

Esse é um verbo ativo, em constante movimento.

Em 1984, na ficção de James Cameron, vemos um homem e uma mulher comuns derrotando, no presente, que agora já é passado, uma sofisticada máquina inteligente vinda do futuro.

Como assim?

Uma máquina que supostamente teria todas as informações sobre a humanidade até o futuro de onde veio não deveria perder essa luta.

Na teoria!

A humanidade, desde que começou a revolução cognitiva, vem acumulando informações de todos os tipos, seja em pedras, tecido, madeira, papel, metal, discos, livros e, quem diria, até em um tipo nuvem digital.

Impressionante.

A fissura que nos define como humanos é ter histórias para contar.

Mesmo que haja alguma emoção nos demais seres vivos da natureza terrestre, apenas nós vemos o tempo através de narrativas.

A criatividade humana bebe dessa angústia para criar os mais sofisticados meios de gravação e as mais variadas linguagens para que o tempo seja nosso aliado, mesmo que essa guerra pareça, muitas vezes, perdida.

A educação nasceu dessa necessidade.

Temos que replicar ideias, conceitos, regras, métricas, noções, normas, visões e a história por trás disso tudo. A geração que vem em seguida não sobrevive sem isso, e a sociedade atual não se sustenta sem sucessivas novas gerações.

Criamos métodos para educar nossas crianças. Mas, será que criamos crianças criativas?

A escola veio da necessidade de cultivar a memória de tudo o que nos define como seres humanos. Mas, chegou uma hora em que ela se transformou em uma indústria.

Chegou um tempo em que alunos se tornaram commodities, ou seja, matéria-prima para processamento dentro de expectativas e necessidades industriais.

Começamos a formar pessoas dentro de padrões específicos, moldando suas mentes, diminuindo a sua humanidade, tornando crianças sensíveis, criativas e questionadoras em sofisticados robôs orgânicos, excelentes repetidores de suas atribuições.

Adultos com formação escolar invejável estão ou perdidos em suas carreiras ou com muito dinheiro no banco, mas com seus corações arrasados por falta de significado em suas vidas.

É uma pandemia de significado.

O vírus do perfeccionismo prolifera por todo o mundo fazendo vítimas em todas as camadas sociais.

Fomos ensinados a sermos perfeitos nas notas da escola, na roupa que vestimos, nos amigos que temos, no emprego que conquistamos, na família e na religião que temos, nas fotos que tiramos, nos lugares e comidas que experimentamos, ou seja, somos reféns do que o resto do mundo pode pensar sobre nós.

O problema é que quase nunca respeitamos a nossa própria opinião.

A educação é um privilégio apenas da escola?

Não!

Mas, infelizmente, ela se tornou uma indústria tão respeitada que esperamos que todo o nosso conhecimento e transformação pessoal venham de um único lugar ou mesmo de origens externas, mas nunca do fruto de nosso próprio esforço e busca interior.

Fomos transformados em máquinas para alimentar um tipo de indústria mecanicista, para atender a uma demanda de trabalho repetitivo, sem questionamentos.

Entre uma jornada de trabalho e outra temos intervalos comerciais e partidas de futebol.

Bebemos a cerveja ou o vinho certos, no lugar apropriado e com as pessoas perfeitas. Tudo registrado online.

Entre uma partida e outra, entre uma jornada de trabalho e outra temos encontros semanais com nossos terapeutas.

Deitamos com dúvidas para acordar com um cemitério na cabeça.

As inteligências artificiais perceberam que quanto mais souberem de nós mais precisas serão as respostas para suas principais diretivas, ou seja, serão mais eficazes em controlar nossas vidas.

Todas as Big Techs mundiais já perceberam que o seu valor está atrelado ao desafio de saber o máximo sobre nós e antecipar todo e qualquer desejo de nossos corações.

Elas gravam tudo e registram tudo a nosso respeito.

E será que pessoas sem profundidade e com a sensibilidade comprometida são mais fáceis de serem controladas?

Engraçado as escolas ainda não terem percebido o valor disso e começado a ter registros detalhados de cada criança, a fim de oferecer uma educação desenhada e personalizada para cada criança.

Se são as escolas as responsáveis para nos preparar para a vida, mas estão atrasadas anos-luz, como poderão continuar relevantes em uma realidade tão disruptiva, que provoca microrrevoluções diárias alterando o rumo do mundo a cada instante?

O ciborgue vivido por Arnold Schwarzenegger em O Exterminador do Futuro era a representação máxima da tecnologia de um futuro sofisticado. Até mesmo podia viajar no tempo. Era perfeito em suas atribuições. Uma verdadeira obra de arte da tecnologia.

Infelizmente, foi destruído por duas simples pessoas de um passado onde ele deveria ser imbatível.

A alegoria aqui é uma humanidade robotizada, com sofisticadas ferramentas digitais tentando matar uma antiga humanidade que preferimos esquecer, pois acreditamos que a nossa salvação virá de uma tela eletrônica.

A derrota do organismo cibernético revestido com tecido vivo veio por meio de emoções que ele era incapaz de emular, ou seja, a máquina era perfeita mas perdeu a batalha por que as pessoas envolvidas tinham afeto uns pelos outros.

O perfeccionismo é um vírus imortal. Não há vacina contra algo que define a nossa essência como seres humanos.

Mas, pode e deve haver algum equilíbrio saudável.

Alguns psicólogos argumentam que o perfeccionismo não precisa ser patológico.

Em 1978 D. E. Hamachek, um psicólogo americano, fez uma distinção entre perfeccionismo normal e neurótico. O perfeccionista normal pode estabelecer altos padrões para si mesmo sem cair na autocrítica punitiva. Eles podem até ter prazer em se esforçar para melhorar.

Embora o perfeccionismo possa corroer nosso senso de valor próprio, “poucos de nós desejaríamos desistir da ambição de nos desenvolvermos e crescermos”, diz Josh Cohen, psicanalista e professor na Universidade de Londres.

A educação pode e deve fazer isso por si mesma: se esforçar para melhorar. Não com mais ferramentas eletrônicas apenas, mas com mais sensibilidade e senso de urgência ao ser humano de forma holística.

Para Josh Cohen, o perfeccionismo pode parecer nos estimular para o sucesso adulto. Mas, na verdade, é uma atitude fundamentalmente infantil. Nos infunde a convicção de que a vida efetivamente termina quando desistimos da esperança de nos tornarmos a melhor versão de nós mesmos. Pelo contrário, como muitos de nós descobrimos, às vezes, com muitas dores, esse é o momento em que a vida pode finalmente começar.

O ex-educador do futuro deverá ser aquele que vai perder a batalha para pessoas que ainda acreditam na simplicidade das emoções humanas e na complexidade de seus efeitos.

A educação pode e deve usar a tecnologia para entender melhor a emoção dos jovens e crianças.

Quanto mais informações sobre o seu perfil, mas fácil propor atividades que as estimulem em suas buscas e necessidades criativas, emocionais e sociais.

No segundo filme, James Cameron dessa vez coloca Arnold como o mocinho. A máquina parece aprender com seus erros e até esboça algum tipo de emoção, por mais bizarra que seja.

As máquinas estão sedentas por aprender o que nos torna tão especiais. Um dia, quem sabe, talvez elas saibam o que é isso.

Na verdade, eu espero que nós encontremos essa resposta antes delas.

Hasta la vista, baby!

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