“Favelês”: mais uma língua para as marcas aprenderem, no Cannes Lions 2023

Celso Athayde foi um dos destaques do evento reforçando a potência das comunidades para negócios e inovação

A favela já vem inspirando campanhas e ações criativas há alguns anos, mas desta vez ela esteve literalmente em evidência no palco do Cannes Lions, maior festival de criatividade e publicidade do mundo, na Riviera Francesa. E não só para brasileiros, provando que representantes de marcas e da comunicação global entenderam, finalmente, o potencial de consumo, de inovação e de desenvolvimento desses territórios – que, mesmo com outras nomenclaturas, está presente em praticamente todos os países.

Celso Athayde, fundador da Cufa (Central Única das Favelas) e CEO da Favela Holding, foi o principal responsável por trazer a pauta para o evento este ano. Em conversa com o também brasileiro Sérgio Gordilho, sócio e copresidente da Africa Creative, ele passou por capítulos da sua história, do viaduto que teve como moradia ao trabalho com alguns dos maiores artistas do rap e hip hop, como MV Bill e Racionais MC. Mas seu foco foi exatamente desmistificar o ambiente das comunidades, revelando o valor do “Favelês” para conversar com esse universo com propriedade.

“As pessoas, as marcas e as empresas sempre se dirigiram às favelas como lugar de carência. E eu sempre me perguntei: se a gente é carente, por que quando vamos a um shopping a gente paga o mesmo preço que todo mundo? Por que não temos desconto no trem, no metrô, em eventos esportivos? Eu já morei na rua, já tive de mendigar, e isso sim era carência. Quando fui morar na favela, aquilo para mim era o paraíso. Eu via potência naquelas pessoas, resiliência e força. Quem está no asfalto tem dificuldade de enxergar a diferença e acha que é a mesma coisa. Não é”, enfatizou.

Athayde criou a Favela Holding quando viu que muitas oportunidades de negócio orbitavam o ambiente da favela, tanto para oferecer produtos e serviços positivos para aquela audiência, quanto para gerar emprego e oportunidades para seus moradores. Um dos principais cunhadores do termo “4º setor”, ele defende negócios como esses não devem ter vergonha de visar lucro, indo muito além do trabalho das ONGs, contanto que gere impacto positivo para todos os envolvidos – e, para as marcas, isso gera milhões em oportunidades.

“O erro de muitas empresas é pensar na favela apenas como um lugar para fazer filantropia. As favelas são um celeiro de empreendedores. O que eles querem é fazer negócio”, garantiu.

O grande diferencial de sua operação como holding é ter parceiros de perfil estratégico e complementar. Com isso, ele traz empresas ou profissionais gabaritados no tipo de serviço a ser entregue, pelo lado de business, e entra com o conhecimento dos territórios, dos códigos, da cultura e com a fluência do “favelês”.

“Meu papel é olhar como essas marcas interagem com esse ambiente e fazer isso em parceria e sociedade com esses especialistas”, contou. Entre as operações, uma das primeiras a fazer sucesso foi a Favela Log, que garantia uma logística de entrega dentro das favelas até então impossível por vias normais, tendo como clientes históricos empresas como Amazon, P&G e Natura. O mesmo acontece com a Vai Voando, de turismo, e a Digital Favela, que garante a conexão entre as marcas e influenciadores das comunidades de uma forma mais natural e genuína. Essa, inclusive, está sendo internacionalizada esta semana, chegando à França.

Como acontece com outros idiomas, aprender uma nova língua te traz oportunidade, gera inclusão e autonomia – o que muitas vezes é um passo fundamental para dignidade. Como recado central, Athayde reforçou que os mais de 17 milhões de moradores de favelas geram um potencial de consumo bilionário, maior que grandes países inteiros, e que eles querem – nos mais diferentes sentidos da palavra – a oportunidade para consumir. “A gente precisa agir não para garantir doação de cesta básica, mas para que o favelado possa ir ao supermercado comprar o que ele precisa e, também, o que ele deseja”, completou.

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