Eu vírus você

Passamos a vida como “buracos negros” sugando tudo ao nosso redor. Somos consumidores vorazes de informações.

Sabemos que o bem mais precioso do ser humano é a sua capacidade de prestar atenção no mundo ao seu redor. Essa habilidade tem sido motivo de disputas épicas entre todos aqueles que desejaram obter algum tipo de controle, sejam imperadores, papas ou donos de conglomerados de comunicação. Ter a atenção das pessoas garante que estamos sendo ouvidos, que essas pessoas podem fazer aquilo que for sugerido a elas, direta ou implicitamente.

Cada clique, cada ida à igreja, cada partida de futebol, cada aula, cada capítulo da novela, série da Netflix ou página do livro favorito, são oportunidades nas quais dedicamos a nossa atenção, como um prompt, um ponto de expectativa (por isso somos chamados de expectadores, aqueles que esperam algo) que anseia por receber algo de algum lugar.

Passamos a vida como “buracos negros” sugando tudo ao nosso redor. Somos consumidores vorazes de informações. Quando compramos algo, não compramos a coisa em si, mas o que ela representa. A nossa atenção precisa ser validada. Para que nossos sentidos continuem voltados naquela tal direção é preciso uma recompensa: seja um gol, um beijo no galã, uma reviravolta na trama, um vídeo engraçado ou uma benção ou promessa de que algo de bom vai acontecer na minha vida.

Ninguém gosta de ler algo negativo sobre seu signo, mas, a maioria volta no dia seguinte, mesmo que seja para ter certeza de que a previsão sobre o signo da sogra será sombria. A nossa atenção exige o tempo todo que suas preferências sejam saciadas; caso contrário, nossos olhos voltam-se para outra direção, nossos ouvidos percebem outros sons, nossas mãos saltam da banca de bananas para a de beterrabas, assim, num estalo. Não somos seletivos apenas, somos egoístas em busca daquilo que nos dê prazer. Uma vez adestrado, nosso cérebro e seus comparsas, os cinco sentidos, formam a quadrilha do hedonismo.

Com um mouse nas mãos somos como um soldado no meio de uma floresta úmida vietnamita, à espera do helicóptero de resgate, vomitando com nossa M16, atirando para todos os lados, a fim de não morrer sozinho naquele lugar estranho. Clicamos em tudo que nos “rouba” a atenção. Por isso, tantos banner’s e popup’s em nossas telas sensíveis ao toque. Tudo é produzido para tocar os sentidos e ganhar sua preciosa atenção. Mas, não se esqueça, cada clique diz um pouco de mim e um pouco de você.

A igreja, o time e o partido para os quais escolho me dedicar dizem muito sobre mim. Da mesma forma como meus cliques diários me definem nesse mundo digital. Todas as vezes que faço uma escolha, usando um dispositivo eletrônico, um registro é feito e acrescentado ao meu perfil. Ninguém sabe exatamente onde todas as informações estão guardadas, mas elas são reais e estão sendo usadas 24/7 para saber o que você quer, mesmo antes de você desejar.

O conceito “viral” funciona super bem dentro do universo digital, pois ideias entram em partes do sistema, e se multiplicam rapidamente, tomando conta de blocos inteiros até dominar tudo. Cada clique que damos é como um “espirro” virtual, deixando gotículas aqui e ali. E a epidemia vai se espalhando. Quanto mais simples e poderosa for uma ideia, mas fácil e rápido será o seu efeito viral, ou seja, a sua capacidade de dominar o maior número de pessoas.

Somos seres sociais, mas, às vezes, incapazes de dividir o conhecimento que liberta as pessoas e impede que vivam vidas miseráveis, incapazes de tomar melhores decisões. Apenas alimentar e dar sensação de segurança é trata-las como animais domésticos, rebanho dócil, habilitadas simplesmente para manter as coisas funcionando, sendo “máquinas” operando máquinas.

O ser humano é uma espécie de vírus. Ele chega, não pede licença, toma conta de tudo, consome o que tem sem questionar, multiplica-se, deixa seu entulho, e vai para outra parte, para continuar o mesmo processo, agora em maior número, e, por isso, com mais capacidade destrutiva. Em seu eterno fluxo de expansão do “progresso”.

Ainda não conseguimos viver em harmonia com o nosso próprio meio ambiente. Talvez, por isso, estejamos gastando tanto para explorar outros planetas. Onde tem gente, tem destruição, sujeira e novas doenças o tempo todo. Por mais lindo e poético que seja falar da capacidade humana de superação, ainda persiste o fantasma que nos assombra desde que “chegamos” a esse frágil e pálido ponto azul chamado Terra: vamos sobreviver a nós mesmos?

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